Um longo processo acontece para que uma carne bovina de boa qualidade chegue até os consumidores. Tudo começa ainda no campo, durante a alimentação dos novilhos. Muitos produtores investem em plantações das quais possa ser retirada essa alimentação, e o milho é uma das mais utilizadas. Mas, o grande desafio é saber a sua qualidade. Além disso, surge um outro problema: o que fazer com o resíduo que permanece no campo após a colheita do milho, quando colhido para silagem de espigas?
Pensando nesses fatores, um estudo inédito no País, realizado por pesquisadores do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Lavras (DZO/UFLA), obteve resultados importantes, com proposição de uma nova técnica de alimentação de gado. A pesquisa utilizou a silagem de espiga de milho, e a proposta é que essa seja uma alternativa para uma dieta balanceada, prezando pela qualidade da carne. A ideia é que o resíduo, que fica no campo após a colheita, também complemente a alimentação.
Os pesquisadores avaliaram o efeito dos resíduos e da silagem de milho na alimentação dos animais. O resultado foi positivo, mostrando uma carne de boa qualidade e maciez no acabamento.
A pesquisa
A pesquisa passou por diferentes processos e análises. O professor Thiago Bernardes, coordenador do estudo, explica que foram analisados desde o impacto que o animal poderia causar ao solo em que ficou pastando, até a qualidade da carne.
Segundo ele, a proposta foi trabalhar com silagem de espiga (Snaplage), que é composta por grãos, sabugo e brácteas, uma forma de alimento inicialmente utilizada na Itália, aperfeiçoada alguns anos depois nos Estados Unidos e que chegou ao Brasil por volta de 2013. Esse tipo de sistema tem inúmeras vantagens; porém, o grande desafio realmente é dar destino ao resíduo composto de folha e colmo (caule) que permanece no campo após a colheita.
Além disso, Thiago acrescenta que, primeiro, os pesquisadores fizeram a lavoura e colheram as espigas. “Essas espigas foram para dentro de um silo e foram conservadas em forma de silagem. No período em que essa silagem permaneceu no silo, tempo necessário para que o processo fosse concluído, demos continuidade ao experimento, avaliando o desempenho de novilhas de corte que permaneceram na região dos resíduos da colheita. Posteriormente, avaliamos a compactação do solo, fertilidade do solo, fatores que poderiam ter sofrido impactos pelas novilhas (experimento 1).”
O pesquisador Italo Braz Gonçalves de Lima realizou avaliações do solo em que os animais ficavam, para verificar se ocorreu algum comprometimento nas características químicas e físicas. Segundo ele, “os dados mostraram que não houve alterações e que, por consequência, não afetará a lavoura de milho seguinte”.
Além disso, como citado anteriormente, as espigas foram colhidas, picadas, moídas, colocadas dentro de um silo e, depois de 90 dias, tornaram-se silagem. Após esses meses, no experimento 2, setenta e dois animais foram confinados e divididos em três lotes iguais, recebendo diferentes dietas por um período de 84 dias. Nesse experimento, a pesquisadora Elizanne Lima concluiu que “a silagem de espiga de milho pode substituir a silagem de planta inteira e até mesmo o milho moído seco, pois não foram constatadas grandes diferenças no desempenho dos animais em função das dietas”.
O coordenador Thiago ainda ressalta que, paralelamente a essas análises, houve um estudo de metabolismo para avaliar o desempenho nutricional dos animais. Desta vez, seis animais foram submetidos às mesmas três dietas que os outros bois que tinham sido confinados. “No confinamento nós não temos acesso à parte metabólica dos animais, por isso foi importante que essa pesquisa ocorresse, pois compreendemos de que maneira o metabolismo dos animais reagia às diferentes dietas, e assim, termos resultados mais profundos”.
Nessa etapa, coletas eram realizadas diretas do rúmen do animal, além de coleta de conteúdo do omaso (terceira divisão do estômago dos ruminantes), sangue, urina e fezes, com o intuito de saber o que foi ingerido pelos animais, o que excretaram e quais os nutrientes foram absorvidos por seu organismo. O pesquisador Túlio Gomes Justino, que realizou as análises por seis meses, explica que “os resultados parciais demonstram que o uso da silagem de espiga é eficiente para manter o bom funcionamento no trato digestivo dos animais”.
Durante os experimentos, foram utilizadas, portanto, três fontes de fibra/energia:
1) Silagem de planta inteira de milho + Silagem de grãos de milho reconstituídos + milho moído seco (associação frequente usada em confinamentos comerciais, e por isso considerada “testemunha”);
2) Snaplage + milho moído seco;
3) Apenas Snaplage.
Os demais ingredientes (farelo de soja, farelo de algodão e núcleo) foram idênticos nas três dietas.
Após os animais serem abatidos, a qualidade da carne foi analisada, evidenciando uma carne de boa qualidade para os consumidores.
A equipe
Além do coordenador Thiago, o estudo, iniciado em 2018, conta com a participação dos professores do DZO Mateus Gionbelli, Daniel Casagrande, Márcio Ladeira e Érick Batista, congregando também estudantes de graduação e de pós-graduação dos núcleos de estudos em Forragicultura (Nefor) e Pecuária de Corte (Nepec).
Texto original escrito por Greicielle Santos: confira na edição 5 da Revista Ciência em Prosa, páginas 24 a 26.
Adaptações: Claudinei Rezende da Silva.
Imagens: Sérgio Augusto
Edição do vídeo: Eder Spuri