Uma alimentação balanceada é fundamental para uma boa qualidade de vida. Mas você sabe exatamente o que tem no que você come? A partir de um levantamento científico e sistematizado de literatura, realizado na Universidade Federal de Lavras (UFLA), foi criada uma cartilha informativa com evidências científicas que respondem às dúvidas sobre o uso de agrotóxicos em alimentos. O objetivo é que a cartilha sirva de apoio para as ações de educação alimentar e nutricional.
Além dos nutrientes necessários ao organismo humano, os alimentos podem conter também substâncias nocivas, como agrotóxicos. Utilizados principalmente na agricultura para o controle de pragas e doenças e, consequentemente, para garantir maior produtividade, os agrotóxicos são alvos de diversas polêmicas.
O Brasil, um dos principais produtores agrícolas do mundo, liberou, somente em 2020, 493 agrotóxicos, o maior número já registrado pelo Ministério da Agricultura, que compila esses dados desde o ano 2000. Em 2021, até julho, foram outros 310. O registro de agrotóxicos no Brasil é regulamentado pela Lei nº 7.802/89 e pelo Decreto nº 4.074/02, e os órgãos responsáveis pela liberação são a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e o Ministério da Agricultura.
Apesar do aumento da liberação e do uso de agrotóxicos no País, especialistas alertam sobre a falta de melhores políticas públicas para controle e fiscalização das substâncias, bem como orientações aos consumidores.
Os resultados obtidos na pesquisa
A partir desse contexto, foi criada a cartilha informativa sobre o uso de agrotóxicos na produção de alimentos. Ela é fruto de levantamento científico e sistematizado de literatura, realizado por Rafaela Corrêa Pereira (atualmente docente no Instituto Federal de Minas Gerais – câmpus Bambuí), sob orientação do professor da Faculdade de Ciências da Saúde (FCS/UFLA) Michel Cardoso de Angelis Pereira, em atividade de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Nutrição e Saúde da UFLA.
De acordo com a cartilha, a contaminação por agrotóxicos pode ocorrer de diversas formas. Uma delas é a contaminação direta, que afeta principalmente os agricultores, devido à exposição direta e intensiva aos produtos. Há também a exposição crônica, em que todas as pessoas estão sujeitas à contaminação, seja ambiental, seja por alimentos. Em geral, a população está exposta aos resíduos de agrotóxicos que podem estar presentes em alimentos in natura e minimamente processados, de origem vegetal ou animal. Em um estudo recente, realizado pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), constatou-se a presença de agrotóxicos até mesmo em alimentos e bebidas ultraprocessados, consumidos principalmente por crianças.
Em relação ao consumo seguro de alimentos, Rafaela informou que existe a Ingestão Diária Aceitável (IDA). “Este é um parâmetro de segurança definido como a quantidade máxima do componente ativo presente na formulação do agrotóxico que podemos ingerir por dia, durante toda a vida, de modo a não causar danos à saúde. Porém, há o efeito cumulativo, já que diferentes alimentos fazem parte da nossa alimentação ao longo do dia, e esses alimentos podem conter doses diferentes de resíduos, ficando difícil estabelecer o quanto isso é realmente seguro”, comenta. A pesquisadora destaca, ainda, que as embalagens dos produtos não informam aos consumidores sobre a presença de resíduos de agrotóxicos nos alimentos, por exemplo.
Além dos riscos aos consumidores, estudos recentes demonstram o desequilíbrio ambiental ocasionado pelo uso de agrotóxicos, que podem contaminar o solo, a água e a vegetação. Os agrotóxicos liberam agentes patogênicos e também podem ser tóxicos para uma série de organismos, incluindo pássaros, peixes, insetos e plantas não alvo.
Uma alternativa para a produção de alimentos mais saudáveis, seguros (sem resíduos que podem ser prejudiciais à saúde humana a longo prazo) e de qualidade, sobretudo em relação à composição de substâncias bioativas (substâncias funcionais, como compostos fenólicos e carotenoides), são os cultivos orgânicos.
“Além de reforçar essas evidências, nossa pesquisa mostrou que esse aumento de substâncias bioativas proporcionadas pelos cultivos orgânicos traz benefícios adicionais para a saúde do consumidor, principalmente em relação a antioxidantes, já que nesses alimentos o teor de antioxidantes é maior.”, diz Rafaela.
Há, ainda, alternativas caseiras utilizadas para reduzir os resíduos de agrotóxicos em alimentos, como descascá-los sempre que possível e deixá-los de molho em uma solução de água e bicarbonato e, posteriormente, em outra solução com água e vinagre. Apesar de serem boas práticas, essas medidas não podem ser consideradas seguras, pois não se sabe se a porcentagem de redução é significativa a ponto de deixar o alimento com o nível mínimo de resíduo que não traga prejuízos à saúde. Ou seja, elas não eliminam o risco de resíduos de agrotóxicos em alimentos, apenas atenuam a concentração dessas substâncias na superfície dos alimentos.
Acesse a cartilha completa gratuitamente no Repositório Institucional da UFLA.
A estatística por trás dos agrotóxicos
A Lei Federal nº 7.802 entende por agrotóxicos “as substâncias, ou mistura de substâncias, de natureza química, quando destinadas a prevenir, destruir ou repelir, direta ou indiretamente, qualquer forma de agente patogênico ou de vida animal ou vegetal que seja nociva às plantas e animais úteis, seus produtos e subprodutos, e ao homem”. Atualmente o glifosato é o agrotóxico mais comercializado no Brasil e no mundo. Por ano, 173.150,73 toneladas do herbicida e seus sais são vendidas no País, segundo o Ibama.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que, no mundo, 150 milhões de pessoas são intoxicadas anualmente e mais de vinte mil morrem por consequência da exposição a agrotóxicos. A maioria dos casos ocorrem em países em desenvolvimento.
*Notícia finalizada no segundo semestre de 2022 e publicada na última edição da revista Ciência em Prosa.
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Esse conteúdo de popularização da ciência foi produzido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig.