Pesquisa foi a primeira defesa do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Lavras (PPGEAL/UFLA)
Uma hortaliça comum na mesa dos brasileiros ganhou um novo formato: em pó. Pesquisadores do Programa de Pós-Graduação em Engenharia de Alimentos da Universidade Federal de Lavras (PPGEAL/UFLA) transformaram a beterraba que conhecemos em micropartículas, utilizando uma técnica chamada de spray chilling, forma de aproveitar resíduos resultantes dos descartes e das perdas da pós-colheita.
Rica em vitaminas A, B, C e minerais como sódio, potássio, zinco, magnésio e ferro, a beterraba também é conhecida por conter substâncias antioxidantes denominadas betalaínas, que são responsáveis por sua coloração vermelha arroxeada. As betalaínas impedem ou retardam processos de oxidação, e apresentam efeitos benéficos à saúde humana, sendo empregadas pelas indústrias como corante natural.
A microencapsulação tem como principal objetivo imobilizar e isolar a substância-alvo, proporcionando múltiplas vantagens: por um lado, a microencapsulação protege a substância da oxidação ou de qualquer outro processo degradante; por outro, a liberação da substância pode ser controlada, o que possibilita a atividade em certo local desejado.
Para microencapsular os extratos de beterraba, a pesquisadora Júlia Peres Antonio empregou diferentes proporções de materiais lipídicos (ácido esteárico e ácido oleico). De acordo com Júlia, “o objetivo foi transformar o extrato da beterraba em um pó para facilitar a aplicação na indústria de alimentos, mas o foco principal do estudo foi, na verdade, aprimorar os parâmetros operacionais do processo e observar a influência da metodologia que utilizamos na estabilidade e na degradação das betalaínas em diferentes condições de armazenamento.”
A pesquisa evidenciou que o pó elaborado com menor concentração de ácido esteárico possui alto potencial para uma liberação antecipada e uma maior retenção das betalaínas, mostrando-se viável para a aplicação em alimentos refrigerados, como gelatinas, geleias, iogurtes e sorvetes. Por outro lado, o aumento do ácido esteárico promove um maior tamanho de partículas e, em temperaturas mais altas, teve um melhor aspecto visual, sendo ideal para alimentos que possam vir a ter boas propriedades de fusão na boca, como chocolates, leites aromatizados e massas para bolo.
Além disso, a beterraba é um alimento funcional, ou seja, é um produto que, quando consumido como parte da dieta, fornece nutrientes básicos e apresenta benefícios para o funcionamento fisiológico e metabólico, melhorando a saúde física e mental, e prevenindo o desenvolvimento de doenças crônico-degenerativas.
Microencapsulação por spray chilling
O composto bioativo ou a substância ativa é o nome dado ao nutriente que, ao ser consumido, vai possuir ação metabólica ou fisiológica específica no organismo humano. No caso da beterraba, a betalaína é o composto bioativo, que atua como antioxidante, previne doenças cardiovasculares e tem propriedades antitumorais, anti-inflamatórias, entre outras.
A estratégia de incorporar compostos bioativos em alimentos e bebidas vem ganhando cada vez mais espaço, atraindo consumidores e despertando o interesse da indústria para atender a novas demandas. No entanto, o uso de pigmentos de origem natural é geralmente limitado devido à sua baixa biodisponibilidade, estabilidade, solubilidade e interação com outros componentes da matriz alimentar.
A professora do PPGEAL Soraia Vilela Borges, orientadora de Júlia, afirma que “esses pigmentos podem ser estabilizados usando a secagem por spray chilling, que, devido à utilização de baixas temperaturas, preserva a coloração e a propriedade bioativa do corante, e, no caso da beterraba, as betalaínas.”
O processo da técnica de spray chilling é baseado na atomização (na dispersão de um alimento líquido em gotículas, formando uma névoa) de uma mistura da substância ativa com material derretido lipídico em uma câmara fria, na qual as gotículas em contato com o ar frio se solidificam e formam um pó.
A técnica apresenta alto rendimento, baixo custo, simples operação e, ainda, minimiza os danos térmicos do material encapsulado pelo emprego de temperaturas relativamente baixas. Além disso, o emprego do ultrassom é apontado como uma ferramenta eficaz para controlar efetivamente a distribuição do tamanho das partículas formadas e, com isso, melhorar a estabilidade a longo prazo das emulsões a serem atomizadas (transformadas em gotículas).
Na área de alimentos, embora seja notório o alto potencial das tecnologias de encapsulamento por spray chilling e a homogeneização das emulsões a partir de dispositivos ultrassônicos para contornar limitações e desenvolver novas aplicações, os estudos envolvendo essas técnicas ainda são bastante escassos. Em relação às substâncias ativas oriundas da beterraba, nenhum estudo anterior foi realizado utilizando a técnica de spray chilling, o que torna a pesquisa desenvolvida na UFLA ainda mais inovadora.
Para Júlia, os resultados alcançados foram satisfatórios. “Entretanto, a pesquisa revelou que, durante o armazenamento, o aumento da temperatura e a umidade foram fatores que afetaram negativamente e influenciaram diretamente a vida útil desses pós, o que poderá ser avaliado em novas pesquisas.”
Defesa de dissertação
A pesquisa de Júlia resultou na primeira defesa de dissertação do PPGEAL da UFLA, realizada recentemente, de forma remota, devido às restrições impostas pela pandemia do Covid-19.
Antes da apresentação, o coordenador do PPGEAL, José Guilherme Lembi Ferreira Alves, falou sobre como esse foi um momento histórico para o Programa. “O Programa de Pós-Graduação foi um sonho para nós, professores. Conseguimos a aprovação e, agora, já temos a nossa primeira defesa de dissertação.”
A orientadora de Júlia, Soraia, complementou deixando seu agradecimento a todos os envolvidos na pesquisa e parabenizando a orientanda por toda a dedicação. “Esse é um sinal de que valeu a pena. Estou muito satisfeita com os resultados.”
Texto: Claudinei Rezende, bolsista Pibec.
Revisão: Gláucia Mendes. Colaboração: Karina Mascarenhas.
Imagens: Júlia Peres Antonio.