Equipe de trabalho de campo, medindo árvores na Amazônia brasileira. Créditos: Adam Ronan/ Rede Amazônia Sustentável.

Enquanto o mundo se reúne na 30ª edição da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), um novo estudo internacional com participação da Universidade Federal de Lavras (UFLA) foi publicado nesta semana pela revista Global Change Biology e revela que o impacto humano sobre a Floresta Amazônica é tão profundo que está inclusive alterando a história evolutiva e a funcionalidade das florestas.  

Conduzido por uma equipe de pesquisadores do Brasil e do Reino Unido, que inclui cientistas da UFLA e das universidades de Lancaster e Oxford, a pesquisa mostra que as perturbações humanas — como a exploração seletiva de madeira e incêndios em florestas primárias, ou o corte raso seguido da regeneração florestal após o abandono da terra (florestas secundárias) — provocam uma mudança abrangente nessas comunidades de árvores hiperdiversas.

De acordo com os pesquisadores, nas conferências como a COP30, o foco das discussões costuma recair sobre o carbono que essas florestas armazenam ou capturam. No entanto, as florestas tropicais são muito mais do que apenas carbono: elas estão entre os maiores reservatórios de biodiversidade do planeta. Por exemplo, a Amazônia abriga até 16 mil espécies de árvores, e um único hectare frequentemente contém mais de 300 espécies. Em comparação, o Reino Unido possui apenas 32 espécies nativas de árvores, e toda a Europa tem cerca de 450.

Nas últimas duas décadas, os cientistas têm desenvolvido métodos para medir mudanças na biodiversidade, criando abordagens “funcionais”, que utilizam características das plantas, como espessura da casca, densidade da madeira, área foliar e conteúdo de micronutrientes das folhas, para então entender a ligação entre as espécies e suas funções no ecossistema. Utilizam também métodos “filogenéticos”, que avaliam como as espécies se relacionam entre si através da evolução.

“Embora esses avanços sejam importantes, nossos resultados mostram que, quando se trata de compreender as influências humanas sobre as florestas tropicais, isso pouco importa — as influências humanas são tão profundas que todas as medidas estão mudando e é a própria perturbação que determina o grau de mudança”, disse a pesquisadora Erika Berenguer, da Universidade de Lancaster e do Environmental Change Institute da Universidade de Oxford, que co-liderou o estudo.

Floresta primária queimada na Amazônia brasileira. A floresta queimou em 2015 e em 2023. Foto de 2024, aproximadamente um ano após o incêndio. Créditos: Cássio Alencar Nunes.

Sobre as etapas de estudo

Os pesquisadores tiveram como amostra mais de 55 mil árvores de diferentes tamanhos em 215 parcelas distribuídas por duas regiões da Amazônia Oriental. As parcelas representavam uma variedade de impactos humanos — desde florestas primárias intactas até florestas primárias que haviam sido exploradas seletivamente, florestas que foram exploradas e queimadas, e florestas secundárias.

Em cada parcela, os cientistas mediram a diversidade de espécies de árvores, a diversidade funcional (relacionando os traços das árvores às funções ecológicas que elas desempenham nas florestas), bem como a diversidade filogenética (grupos evolutivos das árvores dentro das florestas). Isso permitiu obter uma visão abrangente da composição e da diversidade ecológica das florestas.

Principais resultados e discussões

Os cientistas descobriram que todas as perturbações humanas — incluindo exploração seletiva de madeira, incêndios florestais e corte raso seguido de regeneração — afetaram negativamente todas as medidas de diversidade de árvores.

Os resultados destacam que até atividades consideradas como manejo sustentável, como a exploração seletiva de madeira, têm impactos profundos na diversidade das árvores, que constituem a estrutura da floresta e representam a principal fonte de energia para uma infinidade de outras espécies.

As florestas secundárias regeneradas após o desmatamento foram as mais distintas ecologicamente e evolutivamente em relação às florestas primárias intactas — o que, segundo os pesquisadores, não é surpreendente, já que o corte raso é a forma mais severa de alteração humana em florestas tropicais.

Árvore cortada dentro de uma floresta primária na Amazônia brasileira. Créditos: Leonardo de Sousa Miranda.

“Florestas primárias perturbadas e florestas secundárias apresentaram menor número de espécies de árvores, mas também menos linhagens evolutivas e tipos funcionais”, explicou o pesquisador Cássio Alencar Nunes, que também co-liderou o estudo durante parte do seu pós-doutorado na UFLA. Hoje Cássio é pesquisador na Universidade de Lancaster, no Reino Unido. “No entanto, não foi apenas o número que diminuiu — a identidade das espécies, linhagens e tipos funcionais também mudou após a perturbação. A perturbação não apenas empobrece a diversidade de árvores, mas também altera a composição das espécies nas florestas amazônicas modificadas pelo homem. Um exemplo disso é que encontramos uma maior prevalência de espécies chamadas “pioneiras” e muito menos das espécies maiores e de crescimento lento, típicas das florestas intactas.”

As descobertas ressaltam os impactos prejudiciais das atividades humanas sobre a diversidade das florestas tropicais e a importância de proteger as áreas intactas remanescentes contra a exploração seletiva de madeira e os incêndios.

O professor Jos Barlow, da Universidade de Lancaster, comenta que os resultados mostram que as florestas modificadas pelo homem são fundamentalmente diferentes de suas contrapartes intocadas. “À medida que a Amazônia enfrenta crescentes pressões humanas, conservar as florestas primárias intactas é essencial — não apenas por seu potencial de armazenamento de carbono, mas também para preservar a profunda herança evolutiva que moldou um dos ecossistemas mais diversos do planeta”, diz.

“Nossos resultados também demonstram que as florestas primárias perturbadas mantêm um valor ecológico significativo, especialmente quando comparadas às florestas em regeneração após o corte raso. Isso destaca a importância de mecanismos inovadores de proteção, como o Tropical Forest Forever Facility (TFFF), que oferecem uma forma de financiar a conservação de todas as florestas, e não apenas daquelas que permanecem intocadas”, complementa.

Créditos: Adam Ronan/ Rede Amazônia Sustentável.

Para Berenguer, embora o foco da COP30 seja principalmente o carbono, “é essencial vincular as discussões climáticas à biodiversidade se quisermos superar as crises climática e de biodiversidade. Em última instância, é a biodiversidade que garante a provisão de serviços ecossistêmicos, como o sequestro e o armazenamento de carbono. Considerando que as florestas perturbadas apresentam composições empobrecidas e distintas de árvores, é provável que grandes áreas da Amazônia já não sejam capazes de fornecer toda a gama de serviços ecossistêmicos encontrados nas florestas primárias intactas.”

Os resultados estão detalhados no artigo “Multi-faceted assessment of Amazonian tree diversity reveals pervasive impacts of human modifications”.

Este trabalho foi desenvolvido como parte de um programa de pesquisa ecológica de longo prazo (PELD-RAS), financiado principalmente pelo Brasil (CNPq), pelo Reino Unido (UKRI e Global Centre on Biodiversity for Climate do DEFRA) e pela Iniciativa Clima e Biodiversidade da Fundação BNP Paribas.

DOI: 10.1111/gcb.70595

Esta publicação de comunicação pública da ciência foi realizada com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig.

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