Os processos que dão origem ao álcool combustível a partir de cana de açúcar, beterraba, trigo, milho e sorgo doce – assim como aqueles de produção de bebidas alcóolicas – geram o vinhoto como subproduto. Uma pesquisa desenvolvida na Universidade Federal de Lavras (UFLA) identificou resultados promissores quando se utiliza esse rejeito – o vinhoto – como substrato para a produção de biomassa microbiana, que por sua vez pode ser utilizada como suplementação para alimentação de animais, principalmente para algumas espécies de peixes, por ser rica em proteínas. Os resultados desses estudos foram publicados sob a forma de artigo, em agosto, em um periódico internacional de alto fator de impacto – o Journal of Environmental Management
O vinhoto é um resíduo poluidor, que pode acarretar prejuízos ao ambiente. Dessa forma, os resultados da pesquisa contribuem para o reaproveitamento desse produto, minimizando os impactos que ele pode causar ao meio ambiente, além de garantir uma utilização economicamente importante para o resíduo. A pesquisa também buscou comparar o impacto da utilização do vinhoto na fertirrigação do solo quando o subproduto é tratado (ou seja, quando já foi utilizado na produção de biomassa) e quando ainda não passou pelo tratamento. Foi possível observar que o impacto sobre a microbiota nativa do solo é menor quando se utiliza o vinhoto tratado.
A fertirrigação com vinhoto in natura como método corretivo de solos, em substituição a fertilizantes inorgânicos à base de fósforo e potássio, se realizada sob condições inadequadas para determinados tipos de solo e clima, pode acarretar alteração na composição e estrutura do solo, como salinização, acúmulo de metais e lixiviação de nutrientes em águas superficiais e subterrâneas, alterações na qualidade do solo e na macro e microbiota, fitotoxicidade e odor desagradável. Tendo por base essas informações, a pesquisa permitiu também a sugestão de uma concentração em que o vinhoto tratado pode ser utilizado na fertirrigação, sem prejuízos ao meio ambiente.
A relevância do trabalho está na identificação da possibilidade de se utilizar o vinhoto para produzir algo útil e rentável (biomassa microbiana que pode ser usada na suplementação da alimentação animal), ao mesmo tempo em que se reduz o poder poluidor desse resíduo em até 20%, permitindo que, após tratado, possa ser aplicado no solo sem comprometer a microbiota bacteriana, que tem um papel ecológico importante. Assim, o processo gera um produto de alto valor agregado e viabiliza a substituição, nos processos de correção do solo, de produtos químicos por um produto natural, que traz ganhos ao mercado e à sociedade. Tudo isso com procedimentos de fácil operacionalização e de alto interesse para produtores que geram o vinhoto em seus processos.
A pesquisa publicada no Journal of Environmental Management é de autoria dos estudantes do Programa de Pós-Graduação em Microbiologia Agrícola Josiane Pires, Gustavo Ferreira e Kelly Reis, e das professoras do Departamento de Biologia (DBI/UFLA) Rosane Schwan e Cristina Silva. Professora Cristina, que é responsável pelo Laboratório de Microbiologia Ambiental e Industrial e orienta o Núcleo de Estudos em Microbiologia Ambiental e Industrial (Nemai), explica que começou a trabalhar com o tema ainda durante seu pós-doutorado, em 2007 e 2008, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e sob orientação da professora Rosane.
Os trabalhos com vinhoto como substrato para crescimento microbiano já geraram três outras publicações científicas de alto impacto na área de Ciências Agrárias. Essa foi também uma das três pesquisas da UFLA selecionadas para a mostra Inova Minas Fapemig, realizada em Belo Horizonte em julho deste ano. A apresentação dos resultados já ensejou possibilidades de parcerias para a produção da biomassa microbiana em escala piloto. A equipe de pesquisa trabalha também em estudos complementares, com potencial para identificação de resultados que ampliem ainda mais esses primeiros benefícios encontrados no tratamento do vinhoto.
Os microrganismos utilizados durante os experimentos da pesquisa foram obtidos a partir da Coleção de Culturas da Microbiologia Agrícola da UFLA (CCMA/UFLA).
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