Que alimentos e nutrientes as formigas preferem? Essa preferência está relacionada com o local onde vivem (subterrâneo, superfície do solo ou árvores) e com suas dietas (herbívoras/consumidoras de açúcar, onívoras e predadoras)? Pesquisadores do Instituto de Ciências Naturais da Universidade Federal de Lavras (ICN/UFLA), em parceria com outras instituições nacionais e internacionais, analisaram se esses dois fatores interferem na variação do consumo de nutrientes pelas formigas nos seis biomas brasileiros.

O professor colaborador do ICN responsável pela pesquisa, Chaim Lasmar, conta que o estudo avança no conhecimento sobre o funcionamento de comunidades ecológicas locais de formigas ao utilizar, de forma inédita, uma amostragem padronizada nos três locais mais específicos onde as formigas vivem (chamados de micro-habitats), com diversos nutrientes, e em todos os biomas do País. “Usando nossa fauna nacional de formigas, conseguimos resultados importantes para a Ecologia que poderão servir para desenvolver hipóteses e embasar outros estudos a nível global. No geral, nossos resultados indicam uma limitação de açúcar no micro-habitat arbóreo, já que as formigas que buscam por alimentos nas árvores preferiram o açúcar, e uma limitação de gorduras no solo em todos os biomas, pois, no solo, todas as formigas preferiram consumir gorduras. Ou seja, quando as formigas preferem algo, isso indica que esse nutriente está limitado naquele local”, explica.

Além disso, os diferentes grupos formados de acordo com as “dietas” que as formigas seguem, chamados de níveis tróficos, também determinam fortemente suas buscas por alimento, possivelmente porque as formigas tentam corrigir seus desequilíbrios de nutrientes na dieta. “Por exemplo, formigas predadoras obtêm facilmente grandes quantidades de sal e de aminoácidos predando outros organismos, mas podem faltar outros nutrientes, como açúcares e gorduras. Aliás, no nosso estudo percebemos que essas formigas predadoras preferem consumir mais gordura do que açúcar, o que é curioso, já que ambos ficam em falta para esse grupo. Porém, isso acontece porque essas formigas estão buscando combater a falta de energia consumindo gordura, que é muito mais energética do que o açúcar”, completa Chaim.

Durante todo esse processo de busca por alimentos, conhecido como atividade de forrageio, as formigas participam, por exemplo, da dispersão de sementes, do controle biológico pela predação de outros animais e da interação com diversas plantas, no que ambas se beneficiam. Chaim revela que é nessas saídas para procurar alimentos, portanto, que as formigas acabam desempenhando esses diversos papéis importantes dentro do ambiente. “Esses papéis, chamados de funções ecológicas, são desempenhados por todos os animais. E todos eles, inclusive as formigas, se integram ao ambiente por meio da busca por alimentos, justamente porque é aí que eles desempenham as funções ecológicas. Todas essas funções ajudam a manter o equilíbrio, o funcionamento e a manutenção de um ecossistema. O nosso estudo nos ajuda a entender esses processos que acontecem em pequenas escalas espaciais, com comunidades locais de formigas, e, a partir daí, entender o contexto geral, que seria o ecossistema como um todo.”

Passo a passo

Para chegar até esses resultados, a equipe de pesquisa disponibilizou 4.500 tubos contendo açúcar, azeite (gorduras/lipídeos), whey protein isolado e neutro (aminoácidos/proteína) e sal (sódio) nos três micro-habitats das formigas. Cada tubo recebeu um pedaço de algodão contendo um único tipo de alimento. Esses tubos foram colocados de forma variada em sessenta locais distribuídos pelos biomas Amazônia, Mata Atlântica, Caatinga, Cerrado, Pampa e Pantanal. Para essa coleta de dados, a equipe mergulhou pedaços de algodão em soluções líquidas feitas com água destilada e com os alimentos que queriam fornecer às formigas.

Os tubos com as soluções ficaram em cada bioma durante um período de três horas diárias. Eles eram espalhados em dias sem chuvas e coletados ao final desse período de tempo para serem analisados. Os responsáveis pela pesquisa sempre fechavam os tubos ao término das três horas, levando tudo o que estava dentro deles para a análise. Por se tratar de um curto período de tempo, as formigas ainda estavam se alimentando dentro do tubo. As formigas foram contadas e classificadas em laboratório, onde também se observa se eram apenas esses insetos que estavam nos tubos se alimentando e não outros. Isso garantiu que não houvesse incertezas sobre qual inseto consumiu as soluções disponibilizadas. Todo esse método tornou possível observar, após a coleta, qual nutriente cada tipo de formiga, de cada localidade, preferia.

Mais sobre as formigas e a pesquisa

Uma pesquisa anterior realizada pela mesma equipe já havia demonstrado que as formigas preferem buscar os nutrientes que estão mais em falta nos seus ecossistemas. Com esse estudo anterior, que encontrou esses padrões nos biomas brasileiros, os pesquisadores descobriram que essa variação da preferência de nutrientes pelas formigas é influenciada pelo clima e pela produtividade primária das plantas, que é a quantidade de energia produzida pelas plantas para os animais consumirem. Portanto, alterações nesses fatores podem resultar em mudanças das funções ecológicas das formigas (saiba mais sobre o estudo anterior e leia a matéria completa).

Porém, como mostrado no estudo atual, além da variação na preferência de nutrientes em grandes escalas, ainda é possível ver, em uma escala espacial menor (nos micro-habitats), que esses nutrientes estão distribuídos de maneira irregular e em porções diferentes dentro de um mesmo ecossistema e são obtidos em níveis diferentes, dependendo da “dieta” das formigas.

Por isso essa pesquisa pode ajudar a descobrir se essas regras ecológicas sobre preferência de nutrientes valem para todos os tipos de ecossistemas, a entender se existem regras gerais sobre a variação local da busca de nutrientes e a compreender também as conexões entre o ambiente, a comunidade de formigas e as funções ecológicas mediadas por elas.

O artigo e a equipe

O artigo “Testando a dependência de contexto da preferência alimentar das formigas entre micro-habitats e níveis tróficos nos biomas brasileiros” (“Testing the context dependence of ant nutrient preference across habitat strata and trophic levels in Neotropical biomes”) foi publicado em fevereiro na revista norte-americana Ecology.

O trabalho foi parte da tese de doutorado de Chaim no Programa de Pós-Graduação em Ecologia Aplicada da UFLA, que foi orientado pela professora Carla Ribas. Chaim hoje é pesquisador de pós-doutorado e professor colaborador na Instituição. As bolsas de doutorado, doutorado sanduíche em Liverpool e pós-doutorado de Chaim foram financiadas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

O trabalho também conta com a participação do pesquisador de pós-doutorado Antônio Queiroz e do discente doutorando Icaro Wilker, ambos do mesmo Programa. Além disso, o trabalho conta com professores de outras instituições nacionais e do Reino Unido, como Tom Bishop, da Cardiff University; Catherine Parr da University of Liverpool; Fernando Schmidt, da Universidade Federal do Acre (Ufac); e Rodrigo Feitosa, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

A pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (Fapemig) e pela Rufford Foundation, do Reino Unido, contando também com a colaboração voluntária de outras pessoas em campo.

Esse conteúdo de popularização da ciência foi produzido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig.
Fotos: Jonas Aguiar.

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