As plantas medicinais têm propriedades de cura que podem auxiliar no tratamento de diversas doenças, sendo utilizadas, inclusive, como insumo para a produção de medicamentos na indústria farmacêutica. Uma pesquisa que está sendo desenvolvida na Universidade Federal de Lavras (UFLA) analisa os potenciais benefícios da serralha (Sonchus oleraceus), considerada uma hortaliça não-convencional, no controle do vitiligo, uma doença não contagiosa que causa a despigmentação da pele em diferentes partes do corpo de uma pessoa.

A serralha, que é muito popular e consumida por populações rurais, proporciona diversos benefícios à saúde que já haviam sido observados de forma empírica por seus consumidores, como seus efeitos contra problemas hepáticos. Com a pesquisa que está sendo desenvolvida no Departamento de Agricultura (DAG/UFLA), foi testado e constatado que o extrato das folhas de serralha foi eficaz na repigmentação da pele, utilizando o zebrafish (Danio rerio), também conhecido como paulistinha ou peixe-zebra, como modelo biológico. O vitiligo foi induzido nos peixes e, após testes de toxicidade com diferentes concentrações do extrato de serralha, foi desenvolvida uma emulsão (uma mistura entre um ou mais princípios ativos) considerada adequada, que não causava a morte ou nenhum tipo de deficiência nesses animais. A aplicação do extrato de serralha resultou na repigmentação das áreas afetadas da pele dos peixes.

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Com a comprovação do resultado desejado no zebrafish, a equipe de pesquisa partiu para os testes em camundongos (Mus musculus), que são organismos maiores do que os peixes. Os testes preliminares foram positivos, e novamente o extrato de serralha foi capaz de atuar na repigmentação da pele dos camundongos. Atualmente está sendo realizada a análise histológica dos camundongos, com o intuito de verificar se os órgãos do animal foram afetados pela concentração do extrato durante os testes.

Para o estudo foram analisados diferentes acessos da serralha, ou seja, exemplares da planta de diferentes localidades. Por meio de análises químicas do extrato da serralha, identificou-se que o ácido chicórico é o principal composto presente nos acessos analisados nesse estudo. Seus benefícios, inclusive, são relatados na literatura científica do meio, o que evidencia seu efeito anti-inflamatório. O estudo identificou, ainda, que o exemplar coletado em Itumirim (MG) é o que possui maior concentração de ácido chicórico. A pesquisa realizada na UFLA ainda busca entender se a propriedade de repigmentação da pele resulta da ação isolada do ácido chicórico, ou se a interação de outros compostos presentes nas folhas da serralha influenciam no resultado final.

A concentração do ácido chicórico pode variar em cada acesso da serralha, de acordo com a região em que ela é cultivada e com as condições do ambiente. Esses fatores afetam o metabolismo secundário da planta, que é responsável pela produção de seus compostos bioativos.

Além disso, o estudo analisou a plasticidade fenotípica da serralha, que se refere à ampla adaptação da planta a variações no ambiente. Ou seja, é uma planta que pode ser cultivada e sobrevive em diferentes regiões, apresentando resistência às mudanças climáticas e ajustando-se tanto às baixas quanto às altas temperaturas.

As etapas da pesquisa e a equipe

O estudo é liderado pela professora da Escola de Ciências Agrárias de Lavras (Esal/UFLA) Luciane Vilela Resende. Em 2010, ela iniciou uma coleção de hortaliças não convencionais, incluindo exemplares de serralha de vários locais do País, no Setor de Olericultura da Universidade. Os primeiros estudos com serralha foram concluídos em 2020, com a então doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Plantas Medicinais, Aromáticas e Condimentares (PPGPMAC/UFLA) Krisnanda Kelly Castro Lima, orientada por Luciane. Sua pesquisa resultou na tese intitulada “Análise genética, composição fenólica e das capacidades antioxidantes in vitro, e embriotóxicas e melanogênica em zebrafish de extratos de Sonchus oleraceus”. Os resultados obtidos com essa tese foram comprovados em outra tese intitulada “Avaliação da embriotoxicidade e atividade melanogênica em embriões e larvas de zebrafish (Danio rerio) dos extratos aquoso e etanólico de Sonchus oleraceus submetida ao cultivo agroecológico em diferentes estádios fenológicos de colheita”, realizada pela estudante Janina de Sales Guilarducci (PPGPMAC/UFLA), sob orientação dos professores Luciane Vilela Resende, Luis Davis Solis Murgas e Suzan Kelly Vilela Bertolucci.

Para que seja comprovada a eficácia da serralha no tratamento contra o vitiligo, o estudo passa por algumas etapas. Já foram concluídas as fases de seleção do melhor acesso, o estudo da fisiologia da planta, os testes com zebrafish e com camundongos. Atualmente estão sendo realizadas as análises fisiológicas dos camundongos, para identificar os efeitos do extrato de serralha no organismo do animal, além do estudo da patologia do vitiligo. 

Concomitantemente o extrato está sendo nanoencapsulado, e produzida uma nanoemulsão, que será novamente testada nos camundongos e zebrafish. O objetivo é produzir um fármaco em cápsula ou serum de tamanho nanométrico, visto que medicamentos que estão nessa proporção, em geral, apresentam maior eficiência nos resultados. A equipe de pesquisa realiza testes para verificar se, no caso da serralha, o produto nanoencapsulado é, de fato, mais eficiente se comparado ao não nanoencapsulado, já que esse processo aumenta os custos de produção do medicamento. A previsão é que os testes em seres humanos comecem nos próximos semestres, e o estudo seja concluído em 2028.

equipe_serralha.pngO objetivo principal da pesquisa é desenvolver um produto que seja capaz de reverter ou controlar a despigmentação da pele. De acordo com Luciane, o medicamento produzido a partir da serralha pode transformar essa planta, que é considerada daninha e agronomicamente prejudicial a outras culturas, em uma solução para a sociedade. “O vitiligo é uma doença diagnosticada principalmente em jovens, e ela pode causar diversos distúrbios sociais e problemas emocionais, devido à vergonha que as pessoas que têm a doença sentem. Então, poder desenvolver um medicamento, à base de uma espécie desvalorizada em termos de uso, e transformá-la em uma espécie benéfica, é muito interessante. Inclusive, os valores gastos com herbicidas para controlar a propagação da serralha podem ser revertidos na venda, em um medicamento que auxiliará a sociedade”, comenta.

Além da professora Luciane, estão envolvidos no projeto o professor da Faculdade de Zootecnia e Medicina Veterinária (FZMV/UFLA) Luis David Solis Murgas, que coordenou os testes com zebrafish, a professora da Faculdade de Ciências da Saúde (FCS/UFLA) Laura Cristina Jardim Pôrto Pimenta, responsável pelos testes com camundongos, e a professora Suzan Kelly Vilela Bertolucci (Esal/UFLA), responsável pelas análises fitoquímicas. Também realiza pesquisas com a serralha, abordando seus benefícios no consumo alimentar, o professor Eduardo Valério de Barros Vilas Boas (Esal/UFLA). Além disso, os estudantes de pós-graduação, Ana Clara Borges Silva e Anderson de Oliveira Salvati, do Programa de Pós-graduação em Plantas Medicinais, e Lissa Izabel Ferreira De Andrade e Bárbara Guimarães do Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia, orientados por esses professores, contribuem para o desenvolvimento da pesquisa.

Outros estudos utilizando a serralha

Além do estudo que analisa os efeitos do extrato de serralha no tratamento contra o vitiligo, a equipe da professora Luciane analisa os benefícios dessa planta para o tratamento da depressão e da ansiedade. Essas doenças foram induzidas em camundongos, e alguns deles foram tratados com doses de extrato de serralha, e outros com um medicamento já comercializado e utilizado para este fim. Estudos preliminares apontaram resultados positivos, e, em alguns casos, o efeito do extrato foi superior ao do medicamento industrializado. “Ou seja, é um produto de origem natural para controlar um problema que, hoje, é mundial, que é a ansiedade e a depressão”, comenta Luciane.

O objetivo, assim como no estudo com o vitiligo, é produzir um medicamento a partir da serralha que seja eficaz no tratamento contra a depressão e a ansiedade. O estudo ainda está em fase de teste, e conta com a colaboração da professora do Instituto de Ciência Naturais (ICN/UFLA) Elaine Fontes Ferreira da Cunha, que, por meio do uso de inteligência artificial, analisa onde o ácido chicórico atua no sistema neurológico dos camundongos para amenizar, e até mesmo curar, essas doenças.

Apesar de já serem comprovados alguns benefícios da ingestão da serralha, as pesquisas ainda irão analisar se apenas o consumo dessa hortaliça na alimentação pode auxiliar no controle da depressão e da ansiedade, bem como o do vitiligo. Há a intenção de serem produzidas cápsulas para ingestão, a fim de avaliar os resultados. Estudos sobre toxicidade foram realizados no zebrafish, sendo, portanto, um alimento seguro.

Esse conteúdo de popularização da ciência foi produzido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig.

Apuração e Matéria: Mayara Mesquita

Revisão Textual: Ana Eliza Alvim

Revisão de Artes: Samara Avelar

Artes Gráficas: Edër Spuri e Nathália Martins

Imagem: Sérgio Augusto da Silva, Arquivo pessoal - pesquisadores, Getty Images Signature - Kali9, Pexels - Armin Rimoldi e Nadin Sh.

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