Os resultados mostraram, entre outras coisas, que o consumo da bebida é relacionado à sensação de prazer e ao bem-estar social
Tomar vinhos é um hábito que tem crescido no Brasil. Dados recentes divulgados pela Wine Inteligence’s Brazil Landcapes, mostram que o mercado de consumidores de vinho saltou de 22 para 30 milhões. Embora o consumo per capita do brasileiro - cerca de 2 litros por pessoa ao ano - esteja bem abaixo de outros países, como os vizinhos chilenos e argentinos que consomem em média 17 e 23 litros por pessoa ao ano, os consumidores brasileiros podem, com facilidade, encontrar bons vinhos em comércios locais ou em sites especializados.
Para conhecer o perfil desses consumidores brasileiros, o professor Luiz Henrique de Barros Vilas Boas, do Departamento de Administração e Economia da UFLA, coordena uma linha de pesquisa sobre valores pessoais e identidade, e estuda o comportamento do consumo de alimentos. De acordo com o docente, a escolha do vinho como objeto de estudo científico se justifica pela ascensão do mercado nacional. “No Brasil, temos muito conhecimento tecnológico sobre como fazer vinhos, há inclusive vinhos nacionais que ganharam prêmios; porém, ainda há uma demanda para conhecer o consumidor, já que são poucas as pesquisas sobre esse conhecimento de consumo.”
Conforme o professor, o que faz uma pessoa consumir determinado produto, e em quais situações isso ocorre, é algo altamente relevante para a indústria, que poderá desenvolver produtos adequados para atender as necessidades do consumidor. “As pessoas se auto definem com base em seus gostos, no que sentem, nos desejos, nas suas preferências, e a teoria nos mostra que assumimos diversas identidades durante o dia. Compreender as necessidades e desejos que estão por trás do consumo é fundamental para o desenvolvimento de produtos e serviços. ”
A pesquisa, ainda em andamento, foi realizada pelo mestrando Álvaro Leonel de Oliveira Castro, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). O objetivo principal foi entender quais valores pessoais guiam o comportamento de consumo na hora de escolher um vinho,considerando seus atributos e conseqüências de uso, assim como identificar os traços de identidade envolvidos nesta ação de consumo.
Foram realizadas entrevistas com consumidores de vinhos de ambos os sexos, das cidades de Lavras, Varginha, Uberlândia e Belo Horizonte, sendo a maioria com idade entre 38 a 47 anos, renda acima de dez salários mínimos e que participavam de clubes do vinho, confrarias, degustações, ou seja, pessoas com um hábito de consumo frequente e com conhecimento ampliado sobre o produto. “Esses consumidores foram escolhidos por sua relação com vinhos. São pessoas que possuem adegas com vinhos diferenciados, já fizeram turismo em região de vinícolas, cursos de degustação, tomam no mínimo uma taça de vinho especial por semana e adquiriram em média sete garrafas recentemente. ”
A pesquisa abordou a percepção dos consumidores com relação a vinhos especiais. Vinhos especiais são aqueles produzidos de maneira clássica com uvas de melhor qualidade. Para os consumidores entrevistados, o acesso a estes vinhos especiais ocorre por meio de lojas ou sites especializados, e em média, eles afirmaram investir cerca de R$ 82 por garrafa. Quanto a preferência por um estilo da bebida, foi predominante a opção por vinhos tintos, brancos e rosés respectivamente, além dos espumantes. Para metade dos respondentes, as redes sociais representam um meio de interação viável para compartilhar avaliações e opiniões sobre vinhos, sobretudo, quando são considerados aplicativos em smartphones. Ainda segundo o estudo, a assinatura de revistas especializadas sobre o assunto não é um fator determinante, porém, é um meio de informação que foi observado por consumidores que possuem maior vivência no mundo dos vinhos.
Resultados
Os consumidores relataram adquirir o vinho para ocasiões especiais, como uma confraternização, um jantar e, até mesmo, para presentear alguém. De acordo com os pesquisadores, o estudo mostrou que o vinho tem potencial para satisfazer necessidades psicológicas, como por exemplos as interações sociais e a liberdade de pensamento, bem como valores que estimulam a busca por novas conquistas pessoais, que motivam novas experiências de consumo. “O vinho traz uma satisfação para o consumo; a bebida tem o valor simbólico de uma conquista. Além disso, ele reúne pessoas, amigos e familiares, e traz a sensação de liberdade para cultivar pensamentos, e até de estímulo que vem com a surpresa de sentir gostos diferentes naquela bebida. ”
Entre os aspectos mais relevantes da pesquisa está o consumo por aspectos familiares. “Para algumas pessoas, o vinho tem uma representação tão forte na família que há consumidores que compram um determinado vinho pensando na data de nascimento do filho e falam que só degustarão aquela bebida quando o filho se formar. Isso vira um motivador para uma comemoração futura ”.
Outro ponto enfatizado nas respostas foi o conhecimento, conforme diz o mestrando: “o vinho faz com que as pessoas possam estudar e conhecer mais sobre ele,sua história, tradição, como foi produzido.O conhecimento do consumidor também gera uma relação social,sendo um de muitos fatores que caracterizam perfis de consumo diferentes.”Álvaro ainda explica que o vinho é uma bebida de sensações: “quando as pessoas vão comprar a bebida, elas não olham só o rótulo; elas buscam na verdade satisfazer uma necessidade psicológica ou de valores humanos, que é essa questão de se sentir realizado, ter o prazer de degustar, estar na companhia de pessoas, celebrar a vida com alegria, sentir-se melhor consigo mesmo, conviver em sociedade”.
Para os pesquisadores, a perspectiva teórica se mostra evidente na prática dos consumidores quando, a partir dos atributos de interesse identificados no produto, das conseqüências práticas de seu uso, e dos fatores psicológicos envolvidos – como resgatar memórias, lembranças o momentos da vida – estes consumidores buscam suprir suas demandas guiadas por seus valores pessoais. Os resultados obtidos no estudo serão publicados em breve e poderão auxiliar a indústria a direcionar melhor seus produtos a esses públicos, considerando desde o desenvolvimento de novos produtos e sua comunicação ao desenvolvimento de estratégias de segmentação de mercado.
Reportagem: Karina Mascarenhas - bolsista Dcom/Fapemig
Edição de vídeo: Rafael de Paiva - estagiário Dcom/UFLA