Dados disponibilizados pela Relação Anual de Informações Sociais (Rais) apontam um aumento na ocupação de mulheres em cargos de chefia. Elas representam mais de 43% desses cargos no País; porém, conciliar atividades administrativas e tarefas de casa, que historicamente foram destinadas a elas, não é algo tão simples. Para compreender como ocorrem as relações de poder em cargos de gestão e o fato de serem mulheres a ocupá-los, a servidora da Universidade Federal de Lavras (UFLA) Pauline Freire Pimenta, em sua tese de doutorado defendida pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), entrevistou 12 mulheres reitoras e vice-reitoras de instituições federais de Minas Gerais (MG).
No período em que realizou sua pesquisa, das 11 universidades federais, 7 reitorias ou vice-reitorias eram ocupadas por mulheres. Em muitos relatos, ficou registrado como elas precisavam fazer sempre um esforço a mais em suas tarefas administrativas e muitas vezes fazer muito além do que lhes cabia, para demonstrar que eram capazes de exercer aquela função. Além disso, a pesquisa aponta que elas ainda tinham que dar conta da dupla ou tripla jornada de trabalho, pois o sistema patriarcal que rege tradicionalmente as famílias brasileiras impõe que cuidar da casa e dos filhos ainda é uma tarefa destinada às mulheres.
“Nós percebemos a reprodução de algumas falas delas, que se repetiram um pouco. Elas relataram, por exemplo, essa existência do patriarcado, que às vezes elas ainda são consideradas a principal responsável pela casa e pelos filhos, que às vezes o marido entra como uma pessoa que ajuda, quando na verdade ele não tem que ajudar, ele tem que dividir as tarefas de casa em que ambos trabalham”, explica a pesquisadora Pauline.
A vice-reitora da UFLA, professora Édila Vilela de Resende Von Pinho, foi uma das entrevistadas pela pesquisadora. Ela atua no setor administrativo da Instituição há 15 anos. “São 24 anos de universidade, mas acabou que eu me envolvi na área administrativa muito cedo, logo após que eu entrei. Então, são 15 anos de alguma forma trabalhando na área administrativa, desde a coordenação dos programas de iniciação científica até agora. Eu falo que conciliar as atividades acadêmicas com o papel de mãe, de esposa e mais a área administrativa, realmente, exige um esforço a mais”, comenta a vice-reitora.
A pesquisa indica que há esse reconhecimento por parte das entrevistadas de que ocupar cargos de gestão não é tão simples assim, pois além das atividades ligadas ao cargo é preciso conciliar os cuidados familiares. Mas essa ideia de que a tarefa doméstica “pertence” à mulher é também algo combatido por elas, que provaram ser possível ter sucesso tanto na profissão quanto na vida pessoal, ainda com a consciência da importância das lutas e conquistas das mulheres ao longo do tempo.
“Apesar de ainda haver uma reprodução do senso comum de que o lugar de mulher ainda é no lar, e que a responsabilidade maior é da mulher, nós percebemos muitas entrevistadas trazendo falas de que elas defendem a igualdade, defendem todas as conquistas que foram trazidas pelas lutas das mulheres, principalmente pelo fato delas serem pioneiras nesses cargos que elas estão exercendo agora”, completa Pauline.
Mulheres em cargos de chefia
A professora do Departamento de Administração e Economia da Universidade Federal de Lavras (DAE/UFLA) Mônica Cappelle realiza pesquisas sobre relações de trabalho, relações de gênero, identidade, carreira, relações de poder e poder disciplinar. Ela explica que, apesar das inúmeras conquistas advindas das lutas pelas mulheres, que contribuíram para permitir que ocupassem outros espaços além do exclusivo papel de responsáveis pelos cuidados familiares e para aumentar a sua participação em cargos de chefia, é preciso ter um olhar atento sobre quais posições essas mulheres estão ocupando. Um alarmante, ainda, é a questão salarial, já que, em muitas situações, o salário recebido por um homem é mais alto, mesmo a mulher ocupando o mesmo cargo e exercendo as mesmas atividades.
“Dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), apontam que há uma crescente participação das mulheres em cargos de gestão, mas é preciso relativizar em quais tipos de gestão: elas ocupam mais os cargos de apoio e assessoria, como, por exemplo, gestão de pessoas e desenvolvimento, assessoria de comunicação, relações públicas, além de posições de vice: cargos de vice-diretor, vice-presidente, vice-reitor. Esses tiveram maior crescimento na ocupação por mulheres. Agora, aqueles cargos de alta gestão, como diretor de operações, finanças, CEO, ainda são amplamente ocupados por homens”, explica a professora Mônica Cappelle.
Ela completa que, “se analisar, a diferença salarial, é outro ponto mais crítico, pois a diferença salarial entre diretores homens e mulheres ainda ocorre em cerca de 80% dos casos. De acordo com as informações divulgadas pela RAIS, há um indicativo de que o salário médio de um diretor de empresas gira em torno de 16 mil reais, enquanto a mulher que ocupa o mesmo cargo ganha em torno de 7 mil reais”.