Candidaturas coletivas têm ganhado força no Brasil desde as eleições municipais de 2012. Neste ano, mais de 200 iniciativas nesse formato disputaram o pleito em diferentes estados. Para a legislatura 2023-2026, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) contará com dois novos mandatos coletivos, compostos integralmente por mulheres. Essa nova modalidade de representação política propõe mais representatividade e participação popular. Mas como esses grupos têm atuado para ampliar o diálogo com a sociedade e deliberar sobre temas priorizando o interesse público?

Essa questão motivou um estudo desenvolvido na Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Federal de Lavras (UFLA). A dissertação, defendida em 2021 no curso de Mestrado Profissional em Administração Pública, analisou dois mandatos coletivos: o Mandato Coletivo Alto Paraíso, na cidade de Alto Paraíso de Goiás (GO), e o “Muitas-Gabinetona”, em Belo Horizonte (MG) - ambos na legislatura 2017-2020. Os resultados mostraram que esses mandatos seguiram modelos gerenciais compatíveis com os parâmetros de cidadania deliberativa, ou seja, priorizaram a inclusão e a participação da comunidade.

De acordo com a autora do estudo, Samara Avelar, esses mandatos coletivos de fato praticavam processos dialógicos com os cidadãos para as tomadas de decisão. "Seja para aplicação de recursos provenientes da atividade parlamentar, como a destinação das emendas, seja para elaboração de propostas legislativas, os debates estavam presentes. Os grupos desenvolveram também instrumentos de capacitação da sociedade para elaboração de projetos de lei de iniciativa popular e de fomento à participação cidadã e à ocupação da política institucional, possibilitando que atores anteriormente excluídos do debate sobre políticas públicas pudessem se mobilizar e transformar aspectos da sociedade na qual se inserem", relata.

A pesquisa identificou também que essas iniciativas de mandato coletivo pioneiras utilizaram propostas consideradas inovadoras e que podem servir de inspiração para a constituição de candidaturas, ou para a estruturação de mandatos coletivos eleitos. Além da distribuição de funções dentro dos mandatos sob a configuração de co-parlamentares, algo que já tem inspirado o formato das novas candidaturas coletivas, outros exemplos de boas práticas ainda podem ser seguidos e aprimorados, como: a estruturação da equipe parlamentar por meio de chamamentos públicos à comunidade; realização de festivais culturais e de projetos para direcionamento de destinação de recursos, como emendas parlamentares;  criação de uma estrutura de mapeamento das pautas discutidas no âmbito dos movimentos sociais;  definição de espaços dialógicos com a comunidade para elaboração e discussão de leis; articulação com movimentos sociais e redes de moradores para a realização de mobilizações de rua e mutirões para melhorias locais, bem como apoio político, técnico e financeiro a iniciativas desses grupos.

Sobre o estudo

Para realizar as análises, a pesquisa levantou mais de 2 mil textos, entre notícias e entrevistas com os representantes, divulgadas na imprensa sobre o tema; artigos de opinião publicados por atores-chave; projetos de lei protocolados no Legislativo, além de postagens e textos publicados em páginas do Facebook e sites oficiais dos mandatos coletivos. Os dados, referentes a períodos compreendidos entre 2015 e 2020, foram analisados utilizando-se instrumentos teóricos pautados no desenvolvimento da democracia deliberativa e da gestão social.

Os mandatos analisados

Os mandatos coletivos e compartilhados (quando várias pessoas se unem na apresentação da candidatura que tem um projeto comum) podem seguir modelos de organização diversos, mas têm como base um processo em que a tomada de decisão entre os membros do mandato ocorre de forma compartilhada, seja por meio votação, seja pela construção de consenso entre os integrantes.  E a inclusão da participação dos cidadãos nesses processos é facilitada atualmente pelas Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), por meio de plataformas on-line de comunicação.

Na dissertação defendida na UFLA em 2021, foram analisadas as primeiras iniciativas no Brasil a adotarem o nível mais descentralizado de gestão político-administrativa, praticando a deliberação entre os integrantes não só nos processos de tomada de decisão das atividades políticas, mas também da gestão do gabinete, de verbas, de assessores, entre outras atividades administrativas: o Mandato Coletivo de Alto Paraíso de Goiás (GO) e o Muitas-Gabinetona (MG), surgidos nas eleições municipais de 2016. 

Em Alto Paraíso, um grupo de cinco pessoas coordenou as decisões do mandato, representadas por um vereador legitimamente eleito. Já o “Muitas” lançou doze candidaturas em Belo Horizonte, que defendiam o mesmo projeto e as mesmas propostas para o mandato, levantadas por meio dos Instrumentos de participação social. Duas vereadoras foram eleitas em 2016 e, em 2018, integrantes do mandato foram eleitas também para a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) e para a Câmara dos Deputados, levando a iniciativa, chamada de “Gabinetona”, a uma nova configuração que perpassou o Legislativo nos três entes federativos. 

Fragilidade do modelo representativo tradicional

O estudo argumenta que novos modelos de representação política surgiram no mundo como reação às fragilidades do modelo democrático representativo tradicional. “Nos últimos 20 anos, experimentos emergiram na Europa Ocidental e na América Latina substituindo o tradicional modelo de mandato político - em que o poder decisório é centralizado no representante eleito - por formatos em que a tomada de decisão é compartilhada com um grupo de representados”, informa o trabalho.

Nessa perspectiva, a percepção, por parte dos cidadãos, de que os políticos eleitos acabam não representando os  interesses da sociedade torna necessária a construção de novos modelos de representação, que permitam decisões mais certeiras para a coletividade, a partir do envolvimento direto dos cidadãos nas discussões. Para o orientador da pesquisa, professor José Roberto Pereira, os mandatos coletivos representam um passo adiante para a construção de uma democracia deliberativa, “na qual a sociedade se configura como protagonista da ação diante do Estado e do mercado, defendendo os interesses públicos não estatais e construindo o bem comum, na perspectiva da emancipação social e política”.

Desafios da gestão compartilhada

Apesar de representarem uma nova forma de fazer política, os mandatos coletivos e compartilhados ainda carecem de regulamentação, tendo funcionado de forma experimental e com acordos informais entre seus membros. “Para essa eleição, tivemos uma importante decisão do Tribunal Superior Eleitoral que permitiu a inclusão, nas urnas, dos nomes dos mandatos coletivos junto ao nome dos candidatos que os representam. Mas isso ainda não garante juridicamente que o representante eleito tome as decisões de forma coletiva. Essa relação entre os membros do mandato coletivo, e entre o mandato e seus eleitores, está pautada na confiança”, explica Samara.

Outra limitação levantada pela pesquisa é que o fruto do trabalho desses mandatos ainda esbarra nos entraves da dinâmica dos ambientes legislativos. "Das propostas legislativas em que observamos o desenvolvimento por meio de participação popular, identificamos que apenas uma de cada mandato estudado havia sido sancionada até janeiro de 2021. Percebemos que, ainda que os projetos sejam elaborados por meio de um amplo debate, quando chegam à votação nas câmaras legislativas são apresentados, legalmente, apenas pelo parlamentar representante do mandato coletivo. É como se houvesse um afunilamento da capacidade de argumentação em favor daquela proposta, já que os demais integrantes não têm, necessariamente, direito à fala na tribuna”, pondera Samara. 

Para acessar a pesquisa completa, acesse a dissertação “Gestão Social dos mandatos coletivos no Brasil à luz da democracia deliberativa”.

Diretrizes para publicação de notícias de pesquisa no Portal da UFLA e Portal da Ciência

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A Comunicação da UFLA, por meio do projeto Núcleo de Divulgação Científica e da Coordenadoria de Divulgação Científica, assumiu o forte compromisso de compartilhar continuamente com a sociedade as pesquisas científicas produzidas na Instituição, bem como outros conteúdos de conhecimento que possam contribuir com a democratização do saber.

Sendo pequeno o número de profissionais na equipe de Comunicação da UFLA; sendo esse órgão envolvido também com todas as outras demandas de comunicação institucional, e considerando que as reportagens de pesquisa exigem um trabalho minucioso de apuração, redação e revisões, não é possível pautar todas as pesquisas em desenvolvimento na UFLA para que figurem no Portal da Ciência e no Portal UFLA. Sendo assim, a seleção de pautas seguirá critérios jornalísticos. Há também periodicidades definidas de publicação.

Todos os estudantes e professores interessados em popularizar o conhecimento e compartilhar suas pesquisas, podem apresentar sugestão e pauta à Comunicação pelo Suporte. As propostas serão analisadas com base nas seguintes premissas:

  • Deve haver tempo hábil para produção dos conteúdos: mínimo de 20 dias corridos antes da data pretendida de publicação. A possibilidade de publicações em prazo inferior a esse será avaliada pela Comunicação.

  • Algumas pautas (pesquisas) podem ser contempladas para publicação no Portal, produção de vídeo para o Youtube, produção de vídeo para Instagram e produção de spot para o quadro Rádio Ciência (veiculação na Rádio Universitária). Outras pautas, a critério das avaliações jornalísticas, poderão ter apenas parte desses produtos, ou somente reportagem no Portal. Outras podem, ainda, ser reservadas para publicação na revista de jornalismo científico Ciência em Prosa.

  • As matérias especiais de pesquisa e com conteúdos completos serão publicadas uma vez por semana.

  • É possível a publicação de notícias sobre pesquisa não só quando finalizadas. Em algumas situações, a pesquisa pode ser noticiada quando é iniciada e também durante seu desenvolvimento.

  • A ordem de publicação das diversas matérias em produção será definida pela Comunicação, considerando tempo decorrido da sugestão de pauta, vínculo do estudo com datas comemorativas e vínculo do estudo com acontecimentos factuais que exijam a publicação em determinado período.

  • O pesquisador que se dispõe a divulgar seus projetos também deve estar disponível para responder dúvidas do público que surgirem após a divulgação, assim como para atendimento à imprensa, caso haja interesse de veículos externos em repercutir a notícia.

  • Os textos são publicados, necessariamente, em linguagem jornalística e seguindo definições do Manual de Redação da Comunicação. O pesquisador deve conferir a exatidão das informações no texto final da matéria e dialogar com o jornalista caso haja necessidade de alterações, de forma a se preservar a linguagem e o formato essenciais ao entendimento do público não especializado.

Sugestões para aperfeiçoamentos neste Portal podem ser encaminhadas para comunicacao@ufla.br.



Plataforma de busca disponibilizada pela PRP para localizar grupos de pesquisa, pesquisadores, projetos e linhas de pesquisa da UFLA