Por Gilmar Tavares

Professor Titular aposentado e extensionista voluntário do Departamento de Engenharia Agrícola da Universidade Federal de Lavras (DEA/UFLA)

Sabe-se que a expressão "Quo vadis, Domine" (Aonde vais, Senhor?) provém de uma tradição cristã registrada em livros apócrifos, segundo a qual Jesus apareceu a Pedro, que deixava Roma para escapar à perseguição de Nero, e, quando indagado pelo apóstolo "Aonde vais, Senhor?!", respondeu-lhe: "Já que abandonas o meu povo, vou a Roma para ser crucificado, outra vez".

O escritor polaco Henryk Sienkiewicz transformou esse suposto episódio em romance ambientado na Roma Imperial, à época de Nero. E o livro viria a inspirar o famosíssimo filme "Quo Vadis", que foi um retumbante sucesso mundial, inclusive no Brasil.

Ambientado na produção científica da Universidade, respeitadas e guardadas as devidas e imensas proporções, esses relatos inspiraram o presente artigo.

É que, recentemente, participei, a convite, de uma international webnar sobre aquecimento global, efeito estufa, degradação ambiental e suas consequências sobre a segurança alimentar nos países mais pobres e carentes, ao redor do mundo.

Durante o evento, perguntei aos doutos preletores se eles tinham algum plano para implantar naqueles países e/ou comunidades as respectivas e brilhantes apresentações show by web on high TI. Em português: como por as mãos à obra??!!

Ou seja: como pretendem transformar esses high TI seminary em ações práticas, lá nas comunidades mundiais famintas??!! Em português: como por as mãos à massa??!!

Por conseguinte, como transformar magníficos trabalhos científicos, diagnósticos precisos e brilhantes seminários em alimentos sistemáticos e nutritivos para os mais pobres, que sequer conseguem acessar um prato de comida descente, em toda vida, ou mesmo um mísero copo de água potável??!! Em português: como por as mãos na ferida??!!

Afinal, se “a ciência existe para melhorar a vida das pessoas”, segundo Bertold Brecht, quem consegue imaginar pessoas pobres, miseráveis, famintas, doentes, analfabetas, desiludidas em sua comunidades, acessando webnares, seminários e trabalhos científicos com diagnósticos altamente sofisticados e suas propostas com soluções high tech??!!

Para Greta Thunberg, a COP26 foi "só blá-blá-blá". A jovem ativista usou essa manifestação para criticar acidamente a recente conferência do clima promovida em Glasgow/Escócia, pela ONU.

É que, após assistir às dezenas de seminários elaborados com as requintadas tecnologias de comunicação, percebeu que tudo era uma grande propaganda bem elaborada, objetivando, principalmente, angariar fundos e financiamentos para os preletores e suas respectivas organizações. De prático mesmo, nadinha de nada...

Quando acessamos os sites das agências humanitárias da ONU, ficamos boquiabertos com a quantidade, qualidade e beleza dos diagnósticos socioambientais disponibilizados para o público em geral.

São verdadeiras obras de arte acadêmico/científicas, que impressionam pela modernidade dos recursos de comunicação que foram utilizados.

Esses diagnósticos são habilmente comoventes e convincentes para a captação de recursos financeiros, que nunca se revertem para as comunidades diagnosticadas, alimentando-se, assim, o odioso parasitismo da pobreza e da miséria.

Dentre as tecnologias de informação e comunicação atualmente mais utilizadas, estão os recursos audiovisuais mais avançados, como as multimídias, que permitem o trabalho simultâneo com imagens, vídeos, músicas e conteúdos, e que superam a televisão, a reprodução de vídeos, os projetores, os aparelhos de som e também os computadores usuais.

A propaganda enganosa, para que doadores se sensibilizem com os diagnósticos acadêmicos produzidos em multimídias de TI, objetivam apenas provocar comoção e lágrimas e, assim, render muita "grana" em generosas doações para os "coordenadores e coordenados".

Por isso, a impressão que tenho é a de que a África jamais será beneficiada. Afinal, a miserável galinha que produz ovos de ouro para parasitas e sanguessugas contumazes tem que ser mantida viva no formato mais atrasado possível.

Muitas prefeituras brasileiras também já aprenderam o caminho do conhecido "me engana que eu gosto" e contratam, a peso de ouro, Empresas de Assessoria Especializadas em TI para elaborar diagnósticos formatados maravilhosamente bem, mas que nunca sairão do papel.

Porém, serão apresentados aos visitantes, que certamente ficarão emocionados com a obra de arte by high tech e, assim, nunca pedirão para visitar a aplicação na comunidade diagnosticada, mesmo porque, se pedirem, não permitirão!!

E as universidades, com suas publicações científicas cada vez mais sofisticadas, graças aos recursos high tech da TI, objetivam o quê??!! Seria transformar a Universidade em minúsculo Liechtenstein, cercado de imensa Bangaladesh??!!

QUO VADIS UNIVERSITAS? (Aonde vais, Universidade?!), respondo eu: "Já que abandonas o meu povo, sugiro que acessem:

"VALIDAÇÃO CIENTÍFICA E VIÉS EXTENSIONISTA"

 

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