O humano líquido, a solitária, o pegador e a empoderada. Esses são os quatro perfis dos usuários de aplicativos de namoro, segundo um artigo científico publicado em 2022 na Revista Alcance, produzido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da Universidade Federal de Lavras (UFLA). Participaram do estudo 318 pessoas que utilizam aplicativos de namoro, em especial, o “Tinder”, incluindo também as que já utilizaram os aplicativos de relacionamento, mas abandonaram a prática, principalmente a partir do início de um relacionamento sério.
“As novas tecnologias têm transformado o dia a dia da sociedade em muitos aspectos, e um deles é a mudança na forma como se iniciam os relacionamentos entre as pessoas, transformando os modelos tradicionais de envolvimento afetivo em pré-interações mediadas pela tecnologia móvel, seja esse movimento positivo ou negativo para a sociedade. Daí a importância de compreendermos esses movimentos, como forma de subsidiar reflexões sobre as preocupações emergentes desta sociedade pós-moderna em que vivemos. Alguns autores vêm discutindo essa temática, e essa pesquisa confirma esses argumentos”, explica uma das autoras do estudo, Juliana Vieira Borges.
A pesquisa buscou apresentar as características de indivíduos que fazem uso dos meios virtuais, mais especificamente os aplicativos de namoro, além de identificar a existência de perfis definidos de usuários de aplicativos de namoro, as variáveis relevantes na diferenciação desses usuários e a forma como podem ser identificados nas redes.
A amostragem de respostas foi composta a partir do envio de questionários em Google Forms por meio de diferentes veículos e a diversos públicos. O quadro final de respondentes foi de pessoas que são, em sua maioria, mulheres, heterossexuais, com nível de escolaridade superior, residentes em cidades do interior e solteiras. O estudo mostra que os quatro perfis de usuários de aplicativos de namoro possuem comportamentos heterogêneos entre si, moldados majoritariamente por questões de gênero, por questões psicológicas (solidão, autoestima e narcisismo) e motivos relacionados a sexo e entretenimento.
Confira o artigo científico publicado neste ano pelos pesquisadores.
Entenda as características de cada perfil
De acordo com a pesquisa, o ‘Humano Líquido’ é o agrupamento de indivíduos que parecem imersos na modernidade líquida, em que as relações são imediatas e pouco duradouras e que, portanto, são indivíduos que se sentem sempre solitários. Por isso, estão constantemente buscando consumir aplicativos de namoro para se relacionar social e sexualmente. Este personagem não tem nem gênero e nem orientação sexual definida.
Já a ‘Solitária’ é um agrupamento de mulheres que são solitárias e buscam relações sociais que possam gerar um relacionamento duradouro no longo prazo.
O ‘Pegador’ representa o perfil de usuários masculino e diversificado em orientações sexuais, autossuficiente, que busca por aventuras sexuais. Este perfil busca por sexo e é mais elevado entre usuários homossexuais e bissexuais do que heterossexuais. A pesquisa ainda mostra que esse comportamento se relaciona ao ‘Humano Líquido’, uma vez que possui diversas orientações sexuais e diversos gêneros.
A ‘Empoderada’ é um “cluster”, ou seja, aglomerado de respostas, composto prioritariamente por mulheres, que possuem maior nível de escolaridade, são sociáveis e autossuficientes. Possuem curiosidade social e, por isso, afirmam usar aplicativos de namoro.
Segundo a pesquisadora Juliana Vieira Borges, de forma resumida, o grupo "Humano Líquido" parece imerso na modernidade líquida, usa os ‘apps’ de namoro na busca de relações imediatas e pouco duradouras. A “Solitária” busca relações sociais que possam gerar um relacionamento duradouro no longo prazo. O “Pegador” é um ‘bom vivant’ e usa ‘apps’ como suporte ao seu comportamento sexual. A “Empoderada” busca satisfazer sua curiosidade social, mas sem intenções sexuais.
Entenda como foi feita a análise das respostas de cada usuário
As respostas dos usuários foram analisadas a partir de uma metodologia de pesquisa quantitativa do tipo descritiva, que descreve as características de grupos, desvenda ou confere a existência de relação entre variáveis, e estima a proporção de elementos de uma população específica, que tenham determinados comportamentos ou características.
E, para definir o perfil dos usuários de aplicativos de namoro, foi utilizada a análise de conglomerados ou clusters, que busca classificar casos em grupos relativamente homogêneos, em que cada grupo tende a ser semelhante entre si e diferente dos demais. Aliada à análise de clusters, foi adicionada a técnica de discriminante, buscando construir perfis dos grupos a partir da relação entre esses grupos e as demais variáveis intervalares preditoras ou independentes. Para os autores do estudo, é fundamental que o público entenda que os nomes atribuídos, como “O pegador, a empoderada, o humano líquido e a solitária”, não fazem nenhum tipo de exclusão social. Apenas estão relacionados às características desses conglomerados de respostas.
A partir das análises iniciadas pela pesquisa, é possível concluir que a atual sociedade utiliza aplicativos virtuais para diversas necessidades diferentes. De acordo com Juliana, há pessoas que se vestem de outros avatares para representarem algo que não são, e há pessoas que buscam aplicativos para curar carências, conhecer pessoas ou suprir uma demanda interna.
“É importante ficarmos atentos aos objetivos do uso dos aplicativos, visto que são programados para estreitar e aproximar os laços entre as pessoas e, assim, a partir desse contato prévio, construírem um relacionamento. Mas, na verdade, essas mesmas pessoas buscam os aplicativos para suprir deficiências ou demandas pessoais que não necessariamente são funções do aplicativo”, destaca a pesquisadora Juliana.
Além de Juliana Vieira Borges, que atualmente é professora da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) e doutora pela UFLA, são autores do estudo os integrantes do Programa de Pós-graduação em Administração (PPGA/UFLA) Alyce Cardoso Campos, o professor Daniel Carvalho de Rezende e o professor Luiz Marcelo Antonialli.
Esse conteúdo de popularização da ciência foi produzido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig.