Foi publicada, na revista internacional Public Health Nutrition, uma pesquisa que analisou mudanças que ocorreram nos hábitos alimentares e no estilo de vida dos brasileiros a partir do distanciamento social ocasionado pela pandemia de Covid-19. Parte dos resultados mostraram, por exemplo, que houve um aumento significativo no consumo de fast food, pães e refeições instantâneas. O consumo de frutas e vegetais diminuiu.

O artigo intitulado “Lifestyle and eating habits before and during Covid-19 quarantine in Brazil” (“Estilo de vida e hábitos alimentares antes e durante a quarentena de Covid-19 no Brasil”) foi publicado em junho e é resultado do trabalho de um grupo de pesquisadoras da Universidade Federal de Lavras (UFLA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop) e Universidade Federal de Viçosa (UFV).

O estudo, que contou com a participação de mais de mil voluntários on-line, revelou também que, com exceção do jantar e do lanche da tarde, o consumo de refeições mudou visivelmente em comparação com o período anterior ao distanciamento social. Os participantes da pesquisa relataram que, durante a pandemia, passaram a consumir com menor frequência o almoço e lanches no café da manhã. Por outro lado, observou-se uma maior frequência de lanches noturnos e de outras refeições.

Além disso, a pesquisa observou diferenças significativas em aspectos do estilo de vida dos brasileiros, como o consumo de álcool, tabagismo, tempo de sono, tempo de tela (período de utilização de dispositivos de tecnologia digital) e a realização de atividades físicas. Os resultados mostraram um aumento na frequência de consumo de bebidas alcoólicas (com certa redução na dose), um certo aumento na frequência de tabagismo, um aumento de horas no período de sono e no tempo de tela e uma visível redução na prática semanal de atividades físicas em termos de frequência e minutos.

De acordo  com as pesquisadoras, o aumento da frequência do consumo de álcool, por exemplo, pode estar associado a uma tentativa das pessoas de combater o estresse, o tédio e até mesmo possíveis emoções negativas decorrentes do isolamento. Já o aumento do tempo de tela (que inclui computadores, televisões, tablets e celulares) pode ser justificado pelo fato de que mais da metade dos entrevistados relataram que, durante a pandemia, seu tempo de trabalho aumentou. Além disso, muitos dos participantes estão estudando ou trabalhando remotamente em período integral ou parcial. Sobre a redução na prática de atividades físicas, percebe-se que essa é uma mudança ocasionada pela dificuldade de praticar exercícios, já que, com as medidas de segurança, academias, parques e centros de treinamento e de recreação foram diversas vezes fechados. A falta de equipamentos necessários e de orientação profissional também dificultam a prática de atividades físicas em casa.

Dessa forma, com a análise dos resultados, a equipe responsável pelo estudo conseguiu observar como as medidas de isolamento adotadas no Brasil provocaram diversas mudanças no cotidiano das pessoas. De acordo com a pesquisadora Marina Martins Daniel, uma das responsáveis pela pesquisa, observar a redução no desempenho das refeições diurnas e o aumento no desempenho das refeições noturnas, dentre essas tantas outras mudanças, evidencia a necessidade de pesquisas que investiguem as repercussões da pandemia em diversos aspectos. “O distanciamento físico e social é uma medida de segurança altamente recomendada pelas autoridades de saúde. Porém, pesquisas realizadas com populações de outros países já vêm mostrando como essa medida pode acabar afetando a vida e os hábitos das pessoas. Para nós, brasileiros, não foi e nem poderia ser diferente.”

Marina também comenta que diversos fatores podem justificar as alterações nos hábitos alimentares dos brasileiros, que, mesmo estando em casa, passaram a consumir alimentos menos saudáveis. “Durante a pandemia, muitas pessoas provavelmente passaram a procurar por alimentos mais reconfortantes. Quando essa pesquisa foi realizada, estávamos no auge da pandemia e quase tudo estava sob lockdown. Muitos estudos já mostraram que ficar em casa pode desencadear ou agravar quadros ou episódios de ansiedade e depressão nas pessoas, o que pode contribuir para essa alteração no comportamento alimentar, já que as pessoas podem passar a consumir alimentos que são ricos em açúcares e gorduras e que remetem a uma sensação de conforto.”

Mais sobre o estudo

O estudo foi realizado remotamente, com voluntários brasileiros maiores de 18 anos, entre os meses de agosto e setembro de 2020, aproximadamente 5 meses após a implementação da quarentena no País. Informações sobre a pesquisa e o link para acessar o questionário foram divulgados em sites institucionais e nas redes sociais. Um total de 1496 participantes responderam ao questionário, mas, após a validação dos dados, 1368 respondentes foram incluídos no estudo. A participação foi principalmente de mulheres (80%), havendo voluntários de diferentes regiões do País. A maioria dos respondentes, no entanto, reside na região sudeste.

A equipe de pesquisa

Marina é mestranda do Programa de Pós-Graduação em Nutrição em Saúde da Faculdade de Ciências da Saúde, unidade na qual Lívia Garcia Ferreira, também autora da pesquisa, atua como professora adjunta. O estudo ainda contou com a colaboração de Tamires Cássia de Melo Souza (doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência de Alimentos da Faculdade de Farmácia da UFMG), Lucilene Rezende Anastácio (professora adjunta do Departamento de Alimentos da Faculdade de Farmácia da UFMG), Lívya Alves Oliveira (mestranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência da Nutrição do Departamento de Nutrição e Saúde da UFV), Ceres Mattos Della Lucia (professora adjunta do Departamento de Nutrição e Saúde da UFV) e Juliana Costa Liboredo (professora adjunta do Departamento de Alimentos da Ufop).

Texto: Claudinei Rezende, bolsista Pibec.

Revisão: Ana Eliza Alvim.

Imagens: Pexels.

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