Henrique Fernandes Silva - Estudante do Programa de Pós-Graduação em Agroquímica
Elaine Fontes Ferreira da Cunha - Docente do Programa de Pós-Graduação em Agroquímica
Paulo Ricardo da Silva - Docente Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Educação Matemática
Desde os tempos antigos, o ser humano busca maneiras de controlar doenças e melhorar a qualidade de vida. Antes, buscávamos na natureza formas de assegurar a sobrevivência, buscando refúgio em cavernas para fugir de tempestades ou de predadores ferozes. Com a mesma ideia, o uso de vegetais na alimentação e no tratamento de algumas enfermidades ocorria com frequência, baseado no senso comum daqueles povos.
Atualmente, quando somos acometidos por um resfriado, uma inflamação, uma febre ou até mesmo dores mais crônicas, quando orientados por um profissional da saúde, temos a possibilidade de adquirir medicamentos que possam tratar essas enfermidades. Mas você já se perguntou de onde vem esses medicamentos? Como são produzidos? Qual a diferença entre um medicamento genérico, similar ou de referência? Por que há diferença de valores entre eles? Neste texto, será possível descobrir um pouco sobre esses assuntos.
A história começou por volta de 1700, quando houve o surgimento da farmacognosia, ramo da ciência que estuda as substâncias dos medicamentos de origem natural. Após anos de estudos sobre as relações entre plantas e potenciais medicinais, surgiu, em 1811, durante o período pós-Revolução francesa, o “Formulaire”. Esta obra foi proposta por um médico fisiologista francês, François Magendie, e ensina sobre o uso de vários medicamentos da época. Magendie também foi responsável por introduzir a ideia do uso sistemático de animais em testes de laboratório, sendo considerado um dos pioneiros da farmacologia.
A partir desse contexto, bases científicas foram constituídas de maneira a favorecer o avanço sobre o uso de plantas medicinais. Os princípios da farmacognosia acabaram tomando rumos diferentes durante o século XIX, caminhando em direção ao que veio ser a Fitoquímica (estudo dos compostos advindo dos vegetais) e depois a Química de Produtos Naturais, dedicada ao isolamento e à purificação dos princípios ativos das plantas medicinais.
Com o passar do tempo e dos avanços científicos na área da Química e da Biologia, as técnicas de isolamento e purificação das substâncias derivadas das plantas se aperfeiçoaram e se tornaram cada vez mais eficientes. No Instituto Pasteur, em Paris, nos laboratórios de Ernest Fourneau, surgiram as atividades de pesquisa que moldaram a Química Medicinal, que compreende as etapas de descoberta, otimização e desenvolvimento de candidatos a fármacos.
O desenvolvimento de um fármaco é um processo rigoroso, longo (dura aproximadamente 10 anos) e caro (US$ 1 a 3 bilhões/medicamento), que passa pelas etapas de pesquisa experimental, pré-clínica e clínica. Na pesquisa experimental, começa-se com a identificação de um alvo, que pode ser uma proteína, enzima, DNA ou RNA associado a alguma doença. Usando técnicas in silico, ou seja, simulações computacionais, é possível descobrir e desenvolver compostos que podem ativar ou inibir o alvo identificado. Esses compostos podem ser otimizados para melhorar sua eficácia, seletividade e propriedades farmacocinéticas. Uma vez obtidos os resultados positivos, testes in vitro podem ser realizados. Estes são estudos experimentais em células, tecidos ou sistemas biológicos fora do organismo, que são conduzidos em frascos, tubos de ensaio e outros recipientes de vidro ou plástico. A etapa pré-clínica serve para avaliar a segurança dos compostos em modelos animais, determinando possíveis eventos adversos e doses máximas seguras. É importante ressaltar que, mesmo que os compostos sejam aprovados até essa etapa, isso não garante necessariamente que terão os mesmos efeitos em humanos.
A etapa clínica é dividida três fases: a Fase I avalia a segurança, a tolerabilidade e a farmacocinética do medicamento (o que acontece em nosso corpo; por exemplo, o tempo de absorção e eliminação) em um pequeno grupo de voluntários saudáveis, para determinar o perfil de metabolismo e efeitos colaterais; a Fase II avalia a eficácia e a tolerabilidade do fármaco, além de determinar a dose ideal, usando um pequeno grupo de pacientes com a patologia para a qual o fármaco foi desenvolvido; a Fase III serve para confirmar a eficácia e monitorar a segurança do fármaco em um grupo maior, com centenas de pacientes, comparando o novo fármaco com um placebo ou com o medicamento de uso padrão. Se o fármaco for aprovado em todas essas etapas, será feita a solicitação à Anvisa para a fabricação, a comercialização e a venda do novo medicamento. Após a aprovação e a comercialização, o medicamento continua sendo monitorado quanto a efeitos adversos e eficácia em uma população mais ampla. Essa etapa é conhecida como Fase IV dos estudos clínicos e é chamada de farmacovigilância.
Normalmente, o pedido de patente de um novo fármaco é realizado após a descoberta inicial dos compostos, e antes ou durante a fase pré-clínica, para garantir a proteção da inovação. A duração de uma patente deve ficar limitada ao período de 20 anos, a partir da data de depósito feito no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial). Após a patente expirar, a formulação do medicamento ficará disponível, permitindo que laboratórios e indústrias possam usá-la também.
Genérico, similar ou de referência?
Depois de tantas informações, ainda há um tópico a ser discutido: qual é a diferença entre um medicamento genérico, similar ou de referência? Por que há diferença de valores entre eles? Percebemos que, ao comprarmos um medicamento, o farmacêutico geralmente nos pergunta se gostaríamos de levar o genérico. Então perguntamos se são o mesmo medicamento e o farmacêutico responde que sim. De fato, hoje temos nas drogarias três classes de medicamentos: o de referência, o genérico e o similar.
O medicamento de referência é o primeiro a ser desenvolvido para tratar uma doença específica. Ele é submetido a ensaios clínicos rigorosos para comprovar sua segurança e eficácia, e serve como padrão para garantir que os medicamentos genéricos e similares ofereçam a mesma eficácia e segurança quando usados para tratar as mesmas condições. O motivo pelo qual essa classe de medicamento geralmente é mais cara é porque a empresa responsável por sua produção e comercialização teve que custear todas as etapas de avaliação (como já explicado ao longo deste texto) até chegar ao mercado. Esse é o medicamento que detém a patente.
O medicamento genérico é aquele que contém o mesmo princípio ativo (composto químico responsável pelo efeito terapêutico), na mesma dose e forma farmacêutica. Ele é administrado pela mesma via, possui a mesma indicação terapêutica e apresenta a mesma segurança que o medicamento de referência no país, podendo substitui-lo. Geralmente é mais barato do que o medicamento de referência, pois não inclui os custos de pesquisa e desenvolvimento originais e pode se beneficiar da concorrência no mercado.
O medicamento similar contém o mesmo princípio ativo, na mesma dose e forma farmacêutica, é administrado pela mesma via e com a mesma indicação terapêutica do medicamento de referência, porém os excipientes (as substâncias que não possuem função terapêutica em nosso corpo, mas ajudam na preservação e estabilização do princípio ativo) e outros constituintes da formulação podem ser diferentes. Nem todos os medicamentos similares podem substituir o de referência, pois a substituição depende da regulamentação específica e dos critérios estabelecidos pelos órgãos de saúde.
Independentemente do tipo de medicamento, todos devem ser aprovados pela Anvisa. Gostaríamos de lembrar que o uso de medicamentos deve ser feito sob orientação de um profissional de saúde qualificado, e que, ao utilizá-los, devemos guardá-los em locais seguros, arejados, secos, protegidos da luz, ou conforme a descrição na bula. Neste texto, procuramos mostrar que um medicamento só se torna de fato um medicamento após anos de estudos e testes criteriosos, baseados no conhecimento científico. Portanto, não se deixe enganar por notícias falsas!
Os conteúdos e opiniões apresentados nos artigos desta seção são de responsabilidade exclusiva de seus autores, não correspondem à posição institucional da UFLA. As informações, as fotos e os textos podem ser usados e reproduzidos, integral ou parcialmente, desde que a fonte seja devidamente citada e que não haja alteração de sentido em seu conteúdo.