Por Gilmar Tavares

Professor Titular aposentado e extensionista voluntário do Departamento de Engenharia Agrícola da UFLA (DEA/UFLA)

 

Todos nos círculos universitários e em seu entorno já ouviram dizer ou leram e, às vezes, até mesmo reafirmaram, principalmente nas cerimônias acadêmicas oficiais, que a Universidade se apoia em três pilares fundamentais: Ensino- Pesquisa – Extensão. Mas na prática, ou seja, no cotidiano acadêmico em tempo real, tem sido assim mesmo? Será?!

Embora, atualmente, esse triunvirato tenha finalmente ganhado força, na verdade é conveniente lembrar que por muitos anos anteriores, a Extensão foi quase que relegada a terceiro plano. Quantas e quantas vezes ouvia-se dizer que: “Extensão é coisa de bicho-grilo”!! “Extensão é coisa de esquerdista”!! “Extensão é atividade de quem não quer fazer nada”!!

Até mesmo as progressões funcionais de carreira no magistério superior eram extremamente difíceis para os professores extensionistas. As atividades extensionistas quase não valiam pontos, quando comparadas ao ensino e principalmente à pesquisa. Não valia a pena ser Professor Extensionista. Absolutamente desestimulante.

Na apresentação do livro “ Validação Científica e Viés Extensionista” (Novas Edições Acadêmicas-2017), livro esse que editei e publiquei às minhas próprias expensas, para provar a viabilidade de minha tese de conectar trabalhos científicos com viés extensionista na mesma publicação, escrevi o seguinte:

Por quase quarenta anos de ensino, no magistério superior do Departamento de Engenharia da Universidade Federal de Lavras, defendi a proposta de indexação do viés extensionista aos trabalhos científicos de pesquisa em geral, dissertações de mestrado, tese de doutorado e, também, aos programas de orientação acadêmica, em nível de graduação.

Isto porque, neste considerável tempo de serviço como professor universitário, dediquei-me paralelamente, também, de corpo e alma, à

Extensão Universitária Inovadora, especialmente à Agroecologia e à Agricultura Familiar, em suas correlações econômicas, socioambientais e culturais, onde buscávamos transformar pesquisas científicas em tecnologias aplicadas, o que demandava intensas pesquisas pelos artigos científicos e as constantes constatações das dificuldades de interpretação da maioria destes mesmos artigos, normalmente escritos para serem entendidos apenas pela seleta comunidade acadêmica, alijando as pessoas comuns de seus benefícios. 

Sentimo-nos fortalecidos por estas constatações, quando, em 27/07/2003, Marcelo Leite, Editor de Ciências da Folha de São Paulo, publicou em seu jornal, o artigo: “A Chatice da prosa científica”.

John E. Sulston, ganhador do Prêmio Nobel de Medicina em 2002, já dizia que “a Ciência precisa atingir os mais pobres”.

A universidade brasileira ainda é extremamente corporativa. É preciso que ela se abra mais para a sociedade”. Afirmava para a Folha de São Paulo, em 07/01/2003 o conceituado Prof. da UFPR, Carlos Roberto A. dos Santos.

O papel que a ciência tem para melhorar o Brasil não está sendo propagado.” Afirmava para o mesmo jornal em 17/05/2003, o filósofo Renato Janine Ribeiro, em disputa da presidência da SBPC. 

Para atender a estas demandas, e fazer com que a ciência também contemple os sonhos de Brecht, “única finalidade da ciência é aliviar o sofrimento da existência”,em nossa visão, o caminho sempre foi indexar o viés extensionista aos trabalhos científicos”.

 

Atualmente, felizmente e finalmente, a Extensão começa a ocupar o local de pilar fundamental, junto ao Ensino e Pesquisa. As coisas começaram a mudar verdadeiramente quando, em 2007, o governo federal determinou, ordenou, mandou o CNPq financiar projetos exclusivamente de extensão.

Foi uma dura batalha de convencimento, uma queda de braço brutal  entre os “cardeais da pesquisa” e os “sonhadores da extensão”. Diziam que não havia dinheiro para esta aventura. Que o CNPq baixaria o seu nível.  Extensão no CNPq, nunca, jamais. Que diriam do CNPq?

Então, o governo federal da época aportou uma verba do MDA (Ministério do Desenvolvimento Agrário) no CNPq e destinou-a exclusivamente para projetos 100% extensionistas. Foram aprovados um pequeno número de projetos para adequar-se à pequena verba aportada. Eu tive a felicidade de ser contemplado e aprovei o Projeto CNPq Edital 36/2007, “Propostas para Apoio a Projetos de Extensão com Tecnologia Inovadora para Agricultura Familiar” que denominei: Projeto Carrancas.

Mais tarde, tive a felicidade de participar das avaliações dos resultados de todos os projetos deste edital histórico e constatar o sucesso de todos. O primeiro edital CNPq Extensão (36/2007) tinha sido uma retumbante vitória da Extensão Universitária Inovadora. Nunca perco a oportunidade de lembrar a todos que Extensão Universitária Inovadora não é assistência técnica em geral.

Nos anos seguintes, aprovei mais vários projetos extensionistas, uma vez que o CNPq tinha adotado definitivamente a Extensão Universitária Inovadora como política de instituição, criando um espaço definitivo e orçamento específico  para essa finalidade, inclusive ofertando bolsas e incentivos para professores e estudantes extensionistas, como é até hoje, felizmente. Parecia um sonho, mas era realidade.

Na verdade, aqui na UFLA, meu discurso e defesa pró-viés extensionista autêntico começou na ESAL em 1977 e foi se repetindo obstinadamente ao longo da UFLA, e eu tenho a pretensão de afirmar um feito inédito na Universidade brasileira, ou seja, em 1998 consegui a promoção para Professor Titular, graças à Extensão Universitária e, em 2014, quando me aposentei, feliz, apresentei ao CPPD uma centena de projetos extensionistas realizados.

Atualmente, sou Professor Titular aposentado e extensionista voluntário do Departamento de Engenharia Agrícola (DEA) da UFLA e continuo fazendo Extensão Universitária Inovadora com Agroecologia e Agricultura Familiar em Programas de Segurança Alimentar Sustentáveis.

O meu mais recente projeto aborda a Biofertilização, em uma parceria extensionista participativa com o pesquisador Dr. Thomas Mondjalis Poto do INERA (Institut National pour l'Etude et la Recherche Agronomiques) de Kinshasa / Gombe,República Democrática do Congo. Os resultados com Validação Cientifica deste projeto inovador constam no Boletim Técnico nº112 (FEV/2020) da Editora UFLA e o Viés Extensionista está disponibilizado no Repositório Institucional da Biblioteca da UFLA, no espaço: http://repositorio.ufla.br/jspui/handle/1/42286, nos idiomas nativos africanos: swhaili, lingala e kikongo, acompanhados das versões em inglês e francês. Neste mesmo site, estão disponibilizados também mais trabalhos correlatos às tecnologias socioambientais sustentáveis da Agroecologia.

 

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