Um estudo inédito conduzido por um grupo de pesquisadores brasileiros, entre eles o professor Gustavo Hallwass, da Universidade Federal de Lavras (UFLA), trouxe à tona a grave ameaça que a contaminação por mercúrio representa para a saúde pública e para a biodiversidade na Amazônia Brasileira, região que possui uma das mais altas taxas de consumo de peixes do mundo. 

A pesquisa “Análise regional dos níveis de mercúrio em peixes consumidos pela população da Amazônia brasileira: um alerta em saúde pública e uma ameaça à segurança alimentar”, revela que cerca de um quinto (21,3%) dos peixes analisados e consumidos pela população dos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima possuem índices de concentração de mercúrio acima do que é permitido pelas entidades de vigilância sanitária. O máximo recomendado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária é 0,5 micrograma a cada grama do pescado.

O estudo, feito em parceria por pesquisadores da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, da Fundação Oswaldo Cruz (Ensp/Fiocruz); da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA); do Greenpeace Brasil; do Iepé; do Instituto Socioambiental e do WWF-Brasil, cobriu seis Unidades Federativas e suas capitais, além de 11 outros centros urbanos amazônicos, totalizando 17 localidades investigadas. A pesquisa apontou que até mesmo áreas distantes das fontes diretas de contaminação podem apresentar altos níveis de mercúrio. 

"Nosso estudo destina-se a esclarecer a sociedade sobre como a contaminação por mercúrio, proveniente principalmente do garimpo ilegal de ouro, pode afetar milhões de pessoas, inclusive aquelas distantes das áreas diretamente impactadas, uma vez que esse metal é transportado e depositado por processos naturais e atividades humanas, como desmatamento e construção de hidrelétricas,"  ressalta Gustavo Hallwass.

A metodologia da análise

Os peixes analisados foram adquiridos em mercados públicos, feiras-livres ou com pescadores nos pontos de desembarque pesqueiro. Sempre que possível, coletaram-se amostras de pelo menos três diferentes espécies em cada guilda trófica - que se refere à posição que um organismo ocupa na cadeia alimentar - incluindo carnívoros (que comem outros animais), onívoros (que comem tanto plantas quanto animais), detritívoros (que se alimentam de detritos, ou seja, matéria orgânica morta e em decomposição), e herbívoros (que comem plantas). Para cada uma dessas categorias, procurou-se obter no mínimo três indivíduos de cada espécie, com diferentes tamanhos.

Hallwass explica ainda que, durante o estudo, os pesquisadores coletaram 20 gramas de músculo da região dorsal de cada peixe para analisar a quantidade de mercúrio acumulada no tecido. Para avaliar os riscos à saúde de comer peixe contaminado com mercúrio, o estudo seguiu as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS), focando em quatro grupos diferentes de pessoas: mulheres em idade fértil (10 a 49 anos), homens adultos (18 anos ou mais), crianças de 5 a 12 anos, e crianças de 2 a 4 anos. Foram utilizados dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF, 2008) para entender o peso médio de cada grupo.

Para a avaliação de risco, foi considerado o consumo médio aproximado de 100 gramas de peixe por dia para cada pessoa na Amazônia. Além disso, foi considerado que todo o mercúrio nos peixes está na forma de metilmercúrio, a versão mais perigosa desse metal, e que cerca de 80% do mercúrio consumido é absorvido pelo nosso corpo.

Impacto na Saúde Pública e Necessidade de Educação

A pesquisa faz um importante alerta sobre os sérios riscos à saúde pública que a contaminação por mercúrio representa, especialmente os perigos de distúrbios neurológicos para as futuras gerações. É importante ressaltar que a razão de risco da ingestão de mercúrio em crianças de 2 a 4 anos chegou a ser de mais de 30 vezes o valor recomendado pela organização de saúde norte-americana (U.S.EPA), o que realmente compromete e coloca em risco o futuro das crianças amazônidas. O professor Hallwass enfatiza a urgência de criar programas de conscientização e educação ambiental direcionados às comunidades amazônicas, visando esclarecer sobre os riscos do consumo de peixes contaminados. 

“Para combater a contaminação por mercúrio nos ecossistemas aquáticos da Amazônia, é crítico fechar áreas de garimpo ilegal, principalmente em Áreas Indígenas e Unidades de Conservação. Além disso, recomenda-se a escolha de peixes de menor nível trófico, como os herbívoros e detritívoros . Herbívoros, que se alimentam diretamente de plantas, e detritívoros, que consomem detritos e matéria orgânica em decomposição, estão em níveis tróficos mais baixos. Esses peixes tendem a acumular menos mercúrio em seus corpos em comparação com predadores de níveis tróficos superiores, como peixes carnívoros que se alimentam de outros peixes. Também é essencial monitorar constantemente a saúde das populações locais, especialmente as comunidades ribeirinhas que possuem limitado acesso a serviços de saúde,” afirma Hallwass, alertando para os impactos duradouros do mercúrio no sistema nervoso humano.

O estudo também chama a atenção sobre a necessidade essencial de maior apoio e políticas públicas às comunidades de pescadores, por meio do fortalecimento de suas cadeias produtivas e da valorização do pescado, garantindo, assim, uma remuneração justa pelo seu trabalho. Deve-se, ainda, implementar políticas públicas de geração de emprego e renda em regiões remotas da Amazônia, a fim de substituir o papel econômico dos garimpos ilegais nessas regiões. Programas de monitoramento da saúde das populações ribeirinhas são fundamentais para acompanhar e mitigar os impactos da contaminação por mercúrio.

“O monitoramento da contaminação por mercúrio deve ser uma prática contínua, adaptando-se às políticas ambientais que venham a ser implementadas por novas gestões governamentais. Também é necessário realizar estudos longitudinais para mapear as áreas mais afetadas e desenvolver políticas públicas eficazes nesses pontos. Essa abordagem estratégica vai ajudar a identificar e diminuir os riscos associados à contaminação por mercúrio das populações amazônicas”, finalizou Hallwass. 

“Ao olharmos os dados de forma mais detalhada por região, vimos que todos os seis estados amazônicos onde fizemos a pesquisa tinham peixes com mercúrio acima do nível seguro. Os estados de Roraima e Acre foram os que apresentaram a maior quantidade de peixes contaminados, enquanto os estados do Amapá e Pará tiveram os menores índices de contaminação”, conclui Gustavo. 

A pesquisa “Análise regional dos níveis de mercúrio em peixes consumidos pela população da Amazônia brasileira: um alerta em saúde pública e uma ameaça à segurança alimentar”, pode ser acessada em www.arca.fiocruz.br/handle/icict/58839 ou a publicação científica resultante desse estudo em https://www.mdpi.com/2305-6304/11/9/800

Diretrizes para publicação de notícias de pesquisa no Portal da UFLA e Portal da Ciência

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