Zonas tropicais, como a que o Brasil está localizado, são, frequentemente, afetadas pelo fenômeno natural conhecido como El Niño, responsável pelo aquecimento anormal das águas do oceano Pacífico Equatorial. O El Niño envolve fatores atmosféricos e oceânicos e tem origem no território do Peru, resultando em alterações climáticas. Uma pesquisa com a participação da Universidade Federal de Lavras (UFLA), em parceria com outras instituições nacionais, revelou que esse fenômeno contribui para a queda na produção de castanha-da-amazônia, também conhecida como castanha-do-pará.

Os pesquisadores revelam que a busca por essa relação veio do fato de que, após o acontecimento de um dos episódios de El Niño mais intensos no final de 2015 e início de 2016, houve uma queda brusca na produção dessa castanha no ano seguinte (2017). Dados da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) do Amapá, que monitora os frutos dessa espécie desde 2007, revelaram que nunca antes havia sido visualizada uma redução tão grande na produção de castanha-da-amazônia.

Os resultados do estudo mostram que essa queda drástica na produção em 2017 está diretamente relacionada com a redução da chuva local e com o aumento da temperatura média do oceano Pacífico em mais de 2°C, além do aumento da temperatura máxima. Ou seja, a produção foi fortemente afetada pelo El Niño de 2015/2016, que causou um aumento na temperatura máxima mensal e uma redução na chuva regional, prolongando a estação seca de três para seis meses.

A produção de castanha-da-amazônia é bastante prolongada, sendo necessários por volta de 15 meses para o amadurecimento completo dos frutos. A equipe de pesquisa ressalta também que a produção anual desses frutos está relacionada às anomalias térmicas que acontecem cerca de três semestres antes da colheita, ou seja, no início da produção dessa safra.

Para o estudo, foram analisados dois territórios, de nove hectares cada um, localizados no nordeste da Amazônia oriental brasileira: um deles na floresta, com doze anos de monitoramento, e outro na transição floresta/savana, com oito anos de monitoramento. Segundo os dados, a produção média por castanheira em 2017 foi oito vezes menor do que em 2015 e duas vezes menor que a média geral nos dois locais.

De acordo com a pesquisadora egressa do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Florestal (PPGEF/UFLA) e participante do estudo, Dayane Nathália Barbosa Pastana, foi possível perceber também que a área de transição cerrado/floresta é mais sensível a esses eventos extremos, por ter registrado uma queda muito maior do que na área de floresta. “Além disso, os anos com maior e menor produção média por castanheira foram os mesmos nos dois ambientes. Felizmente, observamos também que os dois ambientes se recuperam na safra seguinte de forma proporcional à queda. No entanto, ainda não se sabe até que ponto a espécie tem esse poder de resiliência diante desses eventos, que estão cada vez mais frequentes e intensos”, revela.

Com a pesquisa, foi possível observar, ainda, que os anos com maior produção tiveram relação com períodos anteriores de temperaturas normais ou abaixo do normal, com maior quantidade de chuvas e com predominância do La Ninã, fenômeno oposto ao El Niño, causador de diminuição na temperatura do oceano Pacífico.

Passo a passo

Para a realização da pesquisa, foi utilizado o Índice Oceânico Niño (Oceanic Niño Index - Oni), calculado e fornecido pela Nasa para caracterizar períodos anormais na temperatura da superfície do oceano Pacífico e indicar períodos de neutralidade, mantendo um monitoramento dos fenômenos El Niño e La Niña.

No estudo, os pesquisadores se dedicaram a análises estatísticas utilizando dados de 2005 a 2018 do Oni, da temperatura média mensal do ar, da temperatura máxima mensal do ar e da média de chuva mensal de cada território analisado. Durante as análises, esses dados foram relacionados com a produção de castanha-da-amazônia no período de monitoramento - de 2007 a 2018 - nas duas regiões florestais trabalhadas.

Ao todo, foram monitoradas e analisadas a produção de frutos de 205 árvores desses territórios.

Para além de números

Dayane relata também outro fato: a queda brusca na produção de castanha-da-amazônia interferiu na logística de oferta e demanda, aumentando em até três vezes o preço desse produto, que representa a principal fonte de renda para muitas comunidades extrativistas. “Isso contribuiu para o aumento da violência. Foram relatadas invasões a comunidades e roubo de produtos já preparados para a venda, o que nunca havia acontecido antes. A partir dos nossos dados, esperamos que os extrativistas possam entender melhor o comportamento da espécie diante eventos climáticos extremos e possam realizar uma boa gestão da produção. Esperamos também que nossa pesquisa seja utilizada como pontapé inicial para outros estudos que explorem o assunto, buscando métodos para diminuir as consequências desses eventos climáticos sobre a produção. Um exemplo seriam estratégias como o melhoramento genético da castanheira, para selecionar as mais resistentes a situações adversas.”

A equipe

O artigo “Forte El Niño reduz produção de frutos de castanheiras na Amazônia Oriental” (“Strong El Niño reduces fruit production of Brazil-nut trees in the eastern Amazon”) foi publicado pela revista científica Acta Amazonica em 2021. Dayane deu os primeiros passos para a pesquisa durante o seu trabalho de conclusão de curso em Engenharia Florestal na Universidade do Estado do Amapá (Ueap), dando andamento e a publicando no período em que era mestranda na UFLA (2019-2021).

Além de Dayane, que atualmente é analista ambiental no Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), outros pesquisadores também compõem a autoria do artigo. Da Embrapa Amapá, participaram a bolsista de pós-doutorado Érica de Sousa Modena, a pesquisadora Ana Cláudia Lira-Guedes e o pesquisador Marcelino Carneiro Guedes. Já das Embrapas de Rondônia e da Amazônia Oriental, participaram, respectivamente, as pesquisadoras Lúcia Helena de Oliveira Wadt e Lucieta Guerreiro Matorano. Participa também o mestre pela Universidade Federal do Acre (Ufac) Ezaquiel de Souza Neves. Estão envolvidas, ainda, outras instituições: da Universidade de São Paulo, o doutorando Rafael Lucas Figueiredo de Souza; da Universidade Federal do Amapá (Unifap), o mestre Felipe Felix Costa; e, por fim, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Amapá (Ifap) o professor Anderson Pedro Bernardina Batista.

 

Esse conteúdo de popularização da ciência foi produzido com o apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais - Fapemig.

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